Aula 8
Do Livre Arbítrio
Introdução
A teologia de Westminster é
fortemente ancorada em um entendimento da real condição espiritual do homem. Por
isto, a construção do seu argumento era progressivo em mostrar como os homens
estavam indispostos a andar na direção de Deus por causa do pecado, para depois
mostrar a obra do Espírito Santo em transformar a vontade do homem,
conduzindo-a de volta a vida de adoração e amor ao Criador.
O capítulo 9 da CFW carrega
como tema primordial discutir a condição atual da vontade humana. Este tema é
apresentado em um ponto sensível da CFW, pois é um ponto de partida para as
obras redentivas que se seguem no coração humano, como veremos no desenho
esquemático que apresentaremos no tópico inicial.
Em nossa aula vamos verificar alguns
aspectos deste capítulo. Primeiro, veremos como ele se encaixa dentro da
estrutura do todo da CFW e qual a sua funcionalidade prática dentro do todo. Em
seguida, vamos nos deter na estrutura interna do capítulo e como ele está
internamente organizado. Num terceiro momento, vamos levantar os principais
pontos da tratativa do livre arbítrio tratado no capítulo e por fim, vamos
levantar algumas conclusões práticas sobre a importância deste conteúdo para a
construção de uma mentalidade distintamente cristã.
UM TEMA EXPLICATIVO – O COMPROMETIMENTO
DA VONTADE HUMANA E O PROCESSO DE SALVAÇÃO
Neste primeiro tópico vermos
como o capítulo IX da CFW se encaixa no todo e perceber a qual a necessidade de
entender o comprometimento da vontade humana e a restauração da sua verdadeira
lliberdade como ponto de partida para a ação do Espírito Santo no coração
humano.
Dentro da construção do seu
pensamento, os teólogos de Westminster parecem desejar instruir a igreja em um
entendimento mais completo da obra de redentiva de Deus. Como já vimos fazendo
anteriormente, queremos que os alunos notem que o argumento está sendo
construído a partir fundamentalmente da Escritura. Eles sabiam que o argumento
do sistema calvinista é um choque contra a teologia natural e, por isso,
precisaram mostrar qual a verdadeira condição espiritual do homem caído.
Dentro da construção do seu
pensamento eles propõe a doutrina calvinista da salvação como sendo um
entendimento da REVELAÇÃO DE DEUS. Este entendimento da Revelação Escritural,
aponta para o SER PERFEITO DE DEUS como o ponto de partida para toda a obra redencional,
começando pela CRIAÇÃO DE TODAS AS COISAS E OS ATOS PROVIDENCIAIS de manter o
mundo. A explicação da QUEDA e o PACTO DE GRAÇA de Deus como o homem são os
assuntos que resumem a condição atual do homem, seguido pelo ponto de partida
prático que é a OBRA DO MESSIAS, o MEDIADOR. Assim, a CFW chega ao capítulo 9,
onde ela precisa explicar exatamente qual é o verdadeiro problema do homem em
relação a Deus:
relação a Deus:
A INDISPOSIÇÃO DA VONTADE HUMANA.
Este modelo esquemático mostra
como a CFW está estruturada e de que forma o capítulo IX, que trata do Problema
da Central da Vontade Humana, é apresentado como um ponto de partida para o
entendimento da obra que Deus faz de restaurar o coração humano, redimindo pela
obra do Espírito Santo.
O que notamos como pano de
fundo do argumento de Westminster é a contrapartida à teologia arminiana e
católica que desprezavam a extensão e a profundidade do comprometimento da
vontade humana por causa do pecado. Neste sentido o capítulo IX é um capítulo
explicativo, uma espécie de ponto de partida para tornar o argumento da obra do
Espírito Santo mais fácil de se compreender. Em outras palavras, eles
compreenderem que todos precisamos saber exatamente o que está acontecendo no
coração humano, para que possamos desenvolver uma atitude positiva em relação à
obra de Redenção que Deus desenvolve em nós, por meio do Sacrifício expiatório
de Cristo e a aplicação destas virtudes no coração humano pelo Espírito Santo.
O CAPÍTULO IX E SUA ESTRUTURA INTERNA
O capítulo IX da CFW foi divido
em 5 parágrafos e o tema central é A LIBERDADE DA VONTADE – O Livre Arbítrio da
Vontade. Em todos os parágrafos, a palavra VONTADE é apresentada como sendo o
ponto a ser explicado.
Toda a CFW está disposta para
nos ensinar à respeito da resposta que devemos dar aos atos providenciais de
Deus para nos salvar. O capítulo IX, entretanto, trabalha com o que realmente
acontece em nós que nos impede de viver naturalmente para o Criador, isto é, O
COMPROMETIMENTO DA VONTADE HUMANA.
A Vontade Humana foi Criada Livre
Neste capítulo, em sua primeira
parte os teólogos trabalham com a ideia criacional da vontade humana, que é a
de liberdade total para agir.
Deus dotou a vontade do homem de tal liberdade natural, que ela nem é forçada para o bem nem para o mal, nem a isso é determinada por qualquer necessidade absoluta de sua natureza (CFW IX-1).
Para os teólogos de Westminster,
o homem foi criado com essa excepcional capacidade de agir livremente, segundo
o seu querer, nem forçado ao bem, muito menos ao mal. Isto implica em um estado
peculiar da natureza livre da vontade humana no momento em que este foi criado.
Num segundo momento, dentro
deste primeiro aspecto criacional, os teólogos de Westminster organizam o texto
para mostrar um detalhe desta condição criacional da vontade, que é o centro do
que chamamos de livre arbítrio, a capacidade de agir de forma a mudar o seu
estado de santidade original.
O homem em seu estado de inocência, tinha a liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável a Deus, mas mudavelmente, de sorte que pudesse cair dessa liberdade e poder (CFW IX – 2).
A primeira parte deste
capítulo, portanto, aponta para a condição criacional da vontade humana e
explica que o homem foi criado com uma liberdade total da vontade para agir sem
ser forçado a nada, nem por sua natureza santa. Por outro lado, nesta primeira
parte, eles explicam que o homem foi dotado criacionalmente com a capacidade de
mudar sua condição de santidade e agir contrariamente à sua natureza, de forma
que lhe foi dado a condição de cair dessa liberdade, escolhendo agir
contrariamente à natureza com que foi criado para agradar o Criador.
A Queda produziu o cativeiro da vontade humana
O segundo ponto do capítulo IX
é o central para a intenção dos teólogos na construção dos seus argumentos
sobre a obra de Redenção e eles o explicam nos parágrafos 3 e 4, em dois
momentos distintos.
O primeiro momento desta
explicação é o de afirmação do poder do pecado em gerar um cativeiro para a
vontade humana, levando o homem a viver compleamente comprometido com uma
condição de aversão ao bem espiritual e à busca de Deus.
O homem, ao cair no estado de pecado, perdeu inteiramente todo o poder da vontade quanto a qualquer bem espiritual que acompanhe a salvação; de sorte que um homem natural, inteiramente avesso a esse bem e morto no pecado, é incapaz de, pelo seu próprio poder, converter-se ou mesmo preparar-se para isso (CFW IX – 3).
O tópico da profundidade e
extensão do comprometimento da capacidade humana já havia sido tratado na CFW
no capítulo VI, que trata da QUEDA DO HOMEM.
Por este pecado eles decaíram
de sua retidão original e da comunhão com Deus, e assim se tornaram mortos em
pecado e inteiramente corrompidos em todas as faculdades e partes do corpo e da
alma (CFW VI-2).
Desta corrupção original, pela
qual ficamos totalmente indispostos, incapazes e adversos a todo bem e
inteiramente inclinados a todo mal, é que procedem todas as transgressões
atuais (CFW VI-4).
Desta forma, os teólogos de
Westminister deixam claro o que realmente acontece no homem, enquanto este não
é atingido pela obra de redenção. A discussão teológica que está por detrás
deste parágrafo 3, do capítulo 9, era contra a posição católica de que a
vontade humana era boa ou a visão arminiana de que havia uma graça preveniente
agindo na mente humana antes da conversão.
Por isso, o parágrafo 4, do
capítulo 9, aponta assertivamente para o fato de que Deus é quem age para
libertar o homem deste cativeiro da vontade, devolvendo-lhe à condição de
capacidade de fazer de novo escolhas espiritualmente boas.
Quando Deus converte o pecador e o transfere para o estado de graça, ele o liberta de sua natural escravidão ao pecado e, somente por sua graça, o habilita a querer e a fazer com toda liberdade o que é espiritualmente bom, mas isso de tal modo que, por causa da corrupção ainda existente nele, o pecador não faz o bem perfeitamente, nem deseja somente o que é bom, mas também o que é mau (CFW IX – 4).
Neste segundo momento, a CFW
propõe que a ação de libertação do homem acontece primordialmente no rompimento
das cadeias de escravidão a que o pecado sujeitou o homem. Aqui a CFW enfatiza
que este é um agir gracioso de Deus e que o que ele produz não é uma santidade
obrigatória, mas uma capacitação ou habilitação da vontade de voltar a fazer a
escolha livre pelo bem.
No final do parágrafo, os
teólogos de Westminster apontam para o fato de que a presença do mal no coração
humano, não é retirada totalmente e continua afetando a vontade humana, embora,
no caso do regenerado, isso não seja mais uma condição de escravidão, mas sim
de escolha pecaminosa. Isso, em parte, a CFW já havia ponderado quando
descreveu o processo da queda.
Esta corrupção da natureza persiste, durante esta vida, naqueles que são regenerados, e embora seja ela perdoada e mortificada por Cristo, todavia tanto ela como os seus impulsos são real e propriamente pecado (CFW VI-5).
A Vontade Humana Será Liberta Totalmente da Escravidão na Glória
O tópico final do capitulo 9 é
bem sucinto e aponta para a realidade da redenção final. Nele há uma palavra
que revela uma visão gloriosa da redenção final que é a condição de
imutabilidade que será conferida à natureza humana, depois da obra final do
Espirito Santo no coração humano, isto é, a glorificação.
É no estado de glória que a vontade do homem se torna perfeita e imutavelmente livre para o bem só (CFW IX – 5).
Eles tentam contradizer alguns
anabatistas e outros grupos que acreditavam em uma condição humana de
impecabilidade neste humano, além de explicar em parte o que acontece com a
igreja que ainda revela sinais de sua queda, apesar da obra regeneradora do
Espírito Santo.
QUAL A CONDIÇÃO REAL DA VONTADE HUMANA
HOJE?
O ponto proposicional central
deste capítulo é nos dizer que A VONTADE HUMANA ESTÁ COMPLETAMENTE COMPROMETIDA,
isto é, que não existe mais livre arbítrio para a vontade humana, senão que o
pecado é quem determina as nossas escolhas atuais e faz o homem ser avesso a
todo bem espiritual, isto é, compreender a vida a partir e para o seu Criador.
A Vontade Humana Está Totalmente Cativa do Pecado e Não Há Livre
Arbítrio da Vontade
Eles procuram nos fazer
entender que Deus não criou o homem desta forma e não o submeteu a esta
condição, que foi o homem que se enfiou neste caminho de astúcias pecaminosas,
como Salomão havia dito:
Eis o que tão somente achei: que Deus fez o hoem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias (Ec 7.29).
Desta forma, eles enfatizaram a
condição bíblica de explicação sobre a natureza caída comprometida em obedecer
ao pecado como um senhorio maligno ditando as inclinações da vontade humana.
Porque bem sabemos que a lei é espiritual, eu , todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado (Rm 7.14).
Para a CFW, precisamos
reconhecer nossa completa incapacidade de qualquer bem espiritual (Rm 3.9ss) e
nossa condição de miséria e condenação inevitáveis, para que nos preparemos
para uma obra de redenção baseada completamente na graça de Deus e não em nunca
em nós mesmos.
A Graça de Deus é o ponto central da nossa possibilidade de salvação
A CFW reforça a visão calvinista
da salvação como obra inteiramente da graça, ao mostrar que somente Deus e pela
sua graça é quem pode intervir na condição do homem e mudar as inclinações da
sua vontade, habilitando-a novamente a querer o bem espiritual, isto é, agir de
conformidade e na direção do Criador.
Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados (...) e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo (...) pela graça sois salvos (Ef 2.1-5)
Por isso, o que a CFW faz é
propor uma visão pessimista do homem caído e otimista para o homem redimido. O
pessimismo nasce de uma percepção completa do que o pecado fez na natureza humana
e o otimismo vem da revelação do plano de salvação, do pacto de graça, por meio
do qual, através do sacrifício de Cristo e da obra do Espírito, Deus salva o
homem.
A Salvação é uma obra de Deus por meio do Espírito – preparando para
explicar a obra do Espírito Santo.
A CFW neste capítulo 9, abre
alas para uma explicação completa da obra do Espírito Santo que se seguirá nos
capítulos que seguem.
Porque o pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida e paz. Por isso, o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne, não podem agradar a Deus. Vós, porem, não estais na carne, mas no Espírito (...) SE porém, Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito é vida por causa da justiça. Se habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificara também o vosso corpo mortal, por meio do seu Espírito que habita em vós (Rm 8.6-11).
Esta explicação apontará para o
modo como Deus vencerá a indisposição da nossa vontade mudando o coração
humano, por meio da obra do Espírito Santo.
Conclusão
As conclusões a que chegamos
neste capítulo são simples e necessárias. Primeiro, precisamos compreender que
a vontade humana está comprometida em fazer a vontade do pecado e não a Deus.
Portanto, o homem resiste a fazer a vontade de Deus e se inclina para o
afastamento do Criador.
Compreendendo esta dificuldade
humana na sua relação com Deus, o homem precisa de Deus para que este o
restaure a vontade e a habilite a crer e a querer viver para a sua glória.
Desta forma, precisamos de uma atitude de humildade na busca da presença de
Deus e da mortificação a nossa carne para que o Espírito manifeste o seu poder
em nós.
Porei dentro de vós o meu Espírito, e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis (Ez 36.27).