domingo, 9 de abril de 2017

Aula 07 - Prolegomenos - A Atualidade da Bíblia



AULA 07
A Atualidade da Bíblia
Como as Escrituras devem ser aplicadas ao cotidiano.

Introdução
Na aula de hoje vamos enfatizar o “uso” que fazemos da Bíblia no dia a dia. A proposta é que você descubra os mecanismos de aplicação das verdades bíblicas para as diversas dimensões da sua vida pessoal.
Considerando que Deus estabeleceu Mandatos para que cumpramos nossa tarefa de vida de forma completa, vamos tratar do uso das Escrituras para a vida humana em suas três dimensões: “Espiritual”, “Social” e “Cultural”.
Nosso objetivo final é que você compreenda o mecanismo de aplicação das Escrituras para cada uma destas dimensões e consiga fazer uma leitura da Escritura com mais proveito, sabendo munir, com o uso dos mesmos textos todo o tecido prático da sua vida.
Lâmpada para os meus pés é a tua Palavra e luz para os meus caminhos (Sl 119.105).

As Escrituras e a Dimensão Espiritual da vida
O Mandato Espiritual estabelece a necessidade de uma relação do homem com o Criador. Amar a Deus sobre todas as coisas é o principal objetivo desta ordenação divina para a vida humana.
Note que o uso da palavra “ordenação” em lugar de “ordenança” é proposital, na medida em que não estamos falando apenas da exigência divina para que o homem O ame acima de tudo, mas do fato de que Deus nos criou e preparou todas as coisas que isso acontecesse.
Para que pusessem em Deus a sua confiança (Sl 78.7).
Amar a Deus consiste no estabelecimento de uma relação de confiança e adoração.
O homem foi criado para viver de maneira teorreferente e deveria desfrutar da dimensão espiritual da existência percebendo em tudo o que está ao seu redor, em si mesmo, nas pessoas à sua volta e no modo como vive estes relacionamentos, toda a permeabilidade de Deus na Criação, sem a confusão panteísta de achar que a Criação é Deus.
Com a Queda, o homem perde este estado original de pureza e visão clara da realidade espiritual. As Escrituras são dadas como um desvelamento desta realidade e uma proposta de reestruturação da mente humana para o desfrute de Deus e toda a sua presença na Criação.
Bendize, ó minha alma, ao Senhor! Senhor, Deus meu, como tu és magnificente: sobrevestido de glória e majestade, coberto de luz como de um manto. Tu estendes o céu como uma cortina, pões nas águas o vigamento da tua morada, tomas as nuvens por teu carro e voa nas asas do vento (Sl 104.1-3).
As Escrituras Revelam o Ser Deus
Na busca de nos conduzir de volta a si mesmo, Deus nos oferece nas Escrituras uma reestruturação da nossa consciência de quem é Deus. Ele se revela a nós e nos deixa conhecer a glória do seu Ser.
Os textos bíblicos precisam ser usados no dia a dia para alimentar o nosso conhecimento de Deus. Tal conhecimento produzirá elementos “písticos” (relativos à fé) em nossa percepção da vida e esta nova maneira de ver a vida a partir da glória do Ser de Deus, o Criador, mudará a nossa relação com os acontecimentos.
Os diversos atributos de Deus revelados nas Escrituras são, em última análise, uma descrição do modo como devemos perceber que as coisas foram “ordenadas” para que desfrutemos da presença de Deus em tudo.

As Escrituras Revelam as Obras de Deus
De certa maneira já tocamos neste ponto ao falar sobre o modo como Deus ordenou tudo o que existe para provocar nossa admiração e entrega confiante a Ele. Por isso, as Escrituras revelam as obras de Deus.
Ao descrever as obras de Deus, as Escrituras nos conduzem a perceber sua intencionalidade de cuidar de nós e gerar em nosso coração gratidão e propósito de adoração.
O Salmo 104 é um dos mais ricos em figuras sobre este trabalho de revelar as obras de Deus. Ali, o salmista, usando diversas cenas da vida comum do homem, mostra os atos da Criação e Providência Divina como alavancas doxológicas para o coração humano.
Que variedade, Senhor, nas tuas obras! Todas com sabedoria as fizeste, cheia está a terra das tuas riquezas (Sl 104.24).
Ao contemplar as obras de Deus e perceber seus atos providenciais, o coração humano se desprende da insegurança de viver em um mundo do acaso e redescobre o governo de Deus sobre todas as coisas. Este tipo de descoberta nos leva a um relacionamento de confiança com Deus, não importa qual seja a situação. Por isso é que precisamos alimentar nossa mente com o conhecimento bíblico sobre o agir de Deus no mundo.

As Escrituras Revelam os Desejos de Deus
Sobre a nossa dimensão espiritual da vida, as Escrituras também revelam os intentos de Deus para com a nossa vida e as implicações disto é que devemos saber a direção que Deus quer que tomemos e vivamos numa relação de confiança absoluta com Aquele que sabe o que é melhor para nós.
Eu é que sei que pensamentos tenho a vosso respeito, diz o Senhor; pensamentos de paz e não de mal, para vos dar o fim que desejais. Então, me invocareis, passareis a orar a mim, e eu vos ouvirei. Buscar-me-eis e me achareis quando me buscardes de todo o vosso coração (Jr 29.11-13).
A principal intencionalidade divina revelada nas Escrituras é a Obra de Redenção do homem caído. Portanto as Escrituras nos foram dadas para nos fazer conhecer o “Plano de Redenção” e isto causa uma profunda mudança no depósito de nossa confiança e relação com a realidade.
Podemos tomar como exemplo, o texto de Isaías 45, onde Deus convoca a Ciro para agir em favor do povo da aliança. Ali, o profeta estabelece sua intenção de salvar o seu povo e mostrar a todos que existe só um Deus a quem devemos adorar.
Para que se saiba, até ao nascente do sol e até ao poente que além de mim não há outro, eu sou o Senhor, e não há outro (Is 45.6).
A intencionalidade divina de Redenção deve ser o alimento de todo homem que precisa estabelecer uma relação de confiança final com Deus. Somente um homem que consegue assegurar sua alma sobre a plataforma da certeza da vida eterna consegue realmente amar a Deus sobre todas as coisas em meio as dificuldades e intempéries da vida.

As Escrituras e a Dimensão Social da vida
Entre os mandatos da Criação temos no Mandato Social um dos mais difíceis trabalhos da vida do homem caído: amar o próximo. A tarefa humana de servir a Deus como vice-gerente da Criação envolve o ato de amar os seres humanos caídos, mesmo se forem nossos inimigos.
Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem (Mt 5.44).
Os mandamentos de Deus nos são dados com a finalidade de corrigir os males que a Queda causou ao nosso coração. Entre as terríveis distorções que a Queda causou ao coração humano, a dificuldade nos relacionamentos interpessoais ocupa lugar de destaque. Em outras palavras: como é difícil amar o próximo!
O segundo, semelhante a este é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo (Mt 22.39).
A dimensão social da vida é um dos alvos redentivos de Deus e as Escrituras estabelecem os princípios fundamentais para desenvolvermos uma boa relação humana interpessoal.
As Escrituras Estabelecem a Necessidade do Amor ao Próximo
Amar o próximo e cuidar uns dos outros é o mais profundo exemplo de amor a Deus. Não há nenhuma condição de revelar nosso amor e dependência de Deus senão por meio de uma atitude de cuidado com o nosso próximo, criado à imagem e semelhança de Deus.
Se alguém disser: Amo a Deus, e odiar a seu irmão, é mentiroso; pois aquele que não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê (1Jo 4.20).
A Bíblia é um manual de amor ao próximo! Ela estabelece a necessidade deste amor como a forma mais prática e vital para revelarmos realmente quem o nosso coração ama acima de todas as coisas.
Alimentar o coração com os princípios necessários do amor ao próximo é um ato de sabedoria e nos ajuda a corrigir os desvios mais fundamentais promovidos pela Queda, que estabelece, nas mais importantes relações práticas da vida, os maiores problemas que temos.

As Escrituras Estabelecem as Condições do Amor ao Próximo
A Bíblia, como dissemos, é um manual de amor ao próximo, por isto, ela estabelece as condições em que este amor ao próximo deve ser desenvolvido. Em outras palavras, ela não somente “ordena” (no sentido de dar um comando) que amemos uns aos outros, mas “ordena” (no sentido de estabelecer as condições necessárias) o modo como isto deve acontecer.
Os Dez Mandamentos são fundamentais para este ponto, mas a Primeira Carta de João também pode ser uma das ricas fontes desta sabedoria prática.
Filhinhos, não amemos de palavra, nem de língua, mas de fato e de verdade (1Jo 3.18).
Diversos textos bíblicos trabalham a prática do amor e estabelecem os princípios de como deve acontecer essa mudança na nossa dimensão social da vida. Alimentar nossa mente com estes princípios é fundamental para o reordenamento da nossa existência para o desfrute de Deus e da realidade de um modo completo.

As Escrituras e a Dimensão Cultural da vida
Por dimensão cultural da vida imaginamos todo o relacionamento do homem com as coisas criadas e o produto de todas as relações com o produto do labor humano. O desfrute da realidade como um todo é uma grande bênção porque é vivendo que se serve a Deus. Portanto, toda a história de vida que Deus nos dá é uma oportunidade para viver para a glória de Deus.
Portanto, quer comais, quer bebais ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus (1Co 10.31).
Aprender a viver e se relacionar bem com todas as coisas, isto é, vivenciar as realidades diárias de uma maneira madura, saudável e teorreferente deve ser um dos alvos mais importantes de todo homem.
As Escrituras nos foram dadas para promover esta maturidade e esclarecer para a nossa mente qual a medida e o propósito de cada situação vivencial e como devemos desfrutar da Criação e das suas resultantes.
Toda palavra de Deus é pura; ele é escudo para os que nele confiam. Nada acrescentes às suas palavras, para que não te repreenda e sejas achado mentiroso. Duas coisas te peço; não mas negues, antes que eu morra: afasta de mim a falsidade e a mentira; não me dês nem a pobreza nem a riqueza; dá-me o pão que me for necessário; para não suceder que, estando eu fato, te negue e diga: Quem é o Senhor? Ou que, empobrecido, venha a furtar e profane o nome de Deus (Pv 30.5-9).

A Palavra Impõe Limites ao Desfrute do Labor Humano
Temos todo o direito de gozar o bem daquilo que realizamos e devemos fazê-lo de uma maneira equilibrada e conduzida pelas orientações da Palavra de Deus. Entre os mais ricos materiais bíblicos sobre este tema, podemos considerar o Eclesiastes de Salomão como uma joia da coroa.
Alegra-te, jovem, na tua juventude, e recreie-se o teu coração, nos dias da tua mocidade; anda pelos caminhos que satisfazem ao teu coração, e agradam aos teus olhos; sabe, porém, que de todas estas coisas Deus te pedirá contas (Ec 11.9).
Em geral, o desfrute do produto do nosso labor é uma das áreas que mais nos desviam de Deus. Após a Queda, o homem passou a ter uma relação muito desequilibrada com a riqueza que o seu trabalho produz. Tanto para o lado do muito ganho, como do pouco ganho, somos inclinados a nos desviar de Deus e tentar desfrutar das realidades materiais da vida de forma egocentrada e egorreferenciada.
As Escrituras são pródigas em nos conduzir ao equilíbrio nesta área. Por exemplo, ela indica o uso dos bens como uma ferramenta para amar ao próximo (Ef 4.28); proíbe o coração humano a transformação da riqueza como um objetivo final da vida (Mt 6.19-21); estabelece uma relação de dependência de Deus na produção dos bens para nossa vivencia (Mt 6.11) etc.
Precisamos aprender a desfrutar das realidades materiais da vida e do produto do nosso labor de forma bíblica, o que nos conduzirá a um padrão de vida adequado com quem ama a Deus e deseja praticar também o amor ao próximo como a forma mais direta do primeiro amor.

A Palavra de Deus Impõe Regras para o Desfrute do Labor Humano
O modo como ganhamos e produzimos os recursos necessários à vida também é um dos pontos mais preocupantes para quem deseja viver e agradar a Deus. O mandamento “não furtarás” está no centro deste ordenamento de Deus para o modo como vamos conquistar o que precisamos para viver.
Entre as coisas mais básicas está o padrão bíblico da Providência, isto é, o fato de que devemos nos conscientizar de que qualquer ganho que tenhamos é resultado último da vontade e providência divina.
Riquezas e glórias vêm de Ti, Tu dominas sobre tudo, na tua mão há força e poder; contigo está o engrandecer e a tudo dar força (1Cr 29.12).
Não podemos ganhar nossa vida de forma ilícita, nem defraudar o nosso próximo para que a nossa riqueza se faça a partir do empobrecimento do outro. As Escrituras tratam atos de injustiça na área do ganho como um dos mais terríveis compromissos com as trevas (Am 5.4-15).
Há muitas ordenanças bíblicas que regulam o modo como ganhamos a vida e cada uma delas deve nos dar sabedoria, maturidade e saúde para que vivamos de maneira boa e agradável. De forma que podemos estabelecer uma relação boa com o que temos e aprender a viver com o que Deus nos dá, por meio de nosso trabalho honesto e bem realizado.
Seja a vossa vida sem avareza. contentai-vos com as coisas que tendes; porque ele tem dito: De maneira alguma te deixarei, nunca jamais te abandonarei (Hb 13.5). 
  
A Palavra de Deus Propõe Objetivos do Desfrute do Labor Humano
Todo o labor humano tem um objetivo, produzir as condições necessárias para que possamos viver e servir a Deus e ao próximo.
O trabalho do homem não é um fim em si mesmo, mas uma ferramenta para que Deus traga a este mundo a paz e harmonia por meio de nós, que somos os “jardineiros” de Deus.
Por meio do ganho do nosso trabalho Deus cuida de nós (Hb 13.5-6).
Por meio do ganho do nosso trabalho Deus nos usa para ajudar o outro (1 Jo 3.16).
Por meio do ganho do nosso trabalho Deus sustenta a pregação da Palavra (M 3.10).
O objetivo de todo o labor humano é regulado pela Escritura e tem como destino que cumpramos com o nosso papel neste mundo. Não trabalhamos para nós mesmos, mas para que Deus use o nosso recurso para realizar a sua vontade neste mundo.

Conclusão
Precisamos ler as Escrituras com o propósito de achar nelas a sabedoria prática da vida. Esta sabedoria se constrói com elementos de conhecimento que nos fazem mais sábios e com elementos de inibição do ato pecaminoso, que nos tornem mais santificados.

Aprender a trazer a Escritura para as decisões do dia a dia e para aguçar a nossa percepção da realidade espiritual da vida é um dos verdadeiros propósitos da própria doação das Escrituras para nós. 

domingo, 12 de março de 2017

Aula 4 - Prolegomenos - Inerrância e Infalibilidade das Escrituras



AULA 04
Inerrância e Infalibilidade das Escrituras


Introdução
Em nossa aula anterior tratamos do tema da “Inspiração das Escrituras”. Embora não tenhamos desenvolvido tecnicamente o tema, trabalhamos principalmente o fato da Bíblia ser um livro originado na “mente divina” e “soprado” (teopneumatos – inspirado) ao homem. Nossa ênfase foi dada ao modo como os autores bíblicos, profetas e apóstolos, eram claros em nos dizer de sua compreensão desta origem divina e como instruíam o povo de Deus, a Igreja de Cristo e confiar e praticar a palavra.
Uma decorrência necessária da doutrina da Inspiração das Escrituras é a sua inerrância e infalibilidade. Ou seja, precisamos considerar que se Deus soprou a verdade aos homens, esta verdade soprada deve ser recebida com a confiança de vê-la como a instrução perfeita para a vida.  

O Registro Inerrante da Palavra de Deus
A doutrina da “Inerrância Bíblica” decorre, naturalmente da sua “inspiração”. Assim como a doutrina da inspiração, os crentes devem considerar que os textos originais não possuíam qualquer erro de registro.
A doutrina da inspiração, tanto quanto da inerrância, tem a ver com o registro da Palavra de Deus e, por isso, devemos considerar inerrante é o livro “autógrafo inicial” que foi dado por meio o autor humano.
A preservação dos textos por meio de cópias que foram feitas ao longo dos tempos, está sujeita a erros ortográficos, contudo, a crença corrente no cristianismo histórico é que essa preservação também é resultado da obra de Deus que guarda a sua palavra para o seu povo.
Pois tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi escrito, a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança (Romanos 15.4).
Mais uma vez os autores bíblicos, como Paulo aqui em Romanos, trataram o texto que tinham em suas mãos como inspirado e completamente confiável. Eles criam que as Escrituras não possuíam erros e a recebiam como Palavra de Deus.
Eles consideravam que as “promessas de Deus” propostas nas Escrituras eram absolutamente confiáveis e crer nelas era fundamental para dirigir a vida humana, de forma a agradar a Deus, porque era a revelação da “verdade de Deus”.
Digo, pois que Cristo foi constituído ministro da circuncisão, em prol da verdade de Deus, para confiar as promessas feitas aos nossos pais e para que os gentios glorifiquem a deus por causa da sua misericórdia, como está escrito: Por isso te glorificarei entre os gentios e cantarei louvores ao teu nome (Romanos 15.8-9).
Desta forma, como é possível perceber, os cristãos primitivos foram conduzidos a crer na revelação divina, como a “verdade de Deus” e a confiar nelas, porque as promessas de Deus são verdadeiras.

As Cópias dos Textos
Como enfatizamos acima, consideramos que os registros dos textos originais são considerados inspirados e inerrantes, mas a ação de Deus não parou na inspiração, devemos considerar que a “preservação da Palavra de Deus” também é uma obra de Deus. Contudo, devemos lembrar que em nenhum lugar da Escritura, temos uma defesa de que as cópias feitas eram inerrantes. A confiança nesta preservação pode ser vista em vários textos bíblicos. Mas se destaca na fala de Jesus:
Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da lei, até que tudo se cumpra (Mateus 5.18).
O curioso nessa fala de Jesus é o uso do termo “keraia” (pequeno chifre), que foi traduzido para o português como “til”. As letras hebraicas possuíam uma grafia bem desenhada e suas letras possuíam prolongações no desenho que ajudavam, algumas vezes, na pronúncia e cantilena do texto da Torah. Seja como for, Jesus está dizendo que o texto é preservado e a verdade que ele encerra junto.
Sem dúvida, os textos que temos em mãos, traduzido para o português, são traduções feitas baseadas em cópias do texto bíblico. Estes textos podem ser divididos em vários grupos, dependendo da época e localidade onde foram encontrados. Duas características são fortemente consideradas para se aferir as traduções: a) a antiguidade do texto; b) o número de textos concordantes.
Quando os estudiosos estão definindo qual a melhor tradução, antes eles devem definir qual seria o texto original. Então, eles usam os textos seguindo, em geral e resumidamente, estes dois critérios, procurando os textos mais antigos, mas também aqueles que estão em maior número.
Este procedimento é realizado, especialmente porque existem diferenças pequenas, mas importantes em cópias antigas e mais recentes. Claro que a questão da crítica textual não é resolvida de forma tão simples, mas é um bom princípio inicial para você entender o que tem em suas mãos.
As Traduções
As traduções são, portanto, o resultado desta compilação de textos e formação de um texto mais próximo possível do original. Você lerá em algumas traduções a seguinte informação: de acordo com os melhores e mais antigos manuscristos.
“Em muitas edições da Bíblia (principalmente Bíblias de Estudo), afirma-se que a tradução do texto do Novo Testamento segue os ‘melhores e mais antigos manuscritos’. Esta expressão só se tornou possível a partir da descoberta de muitos manuscritos antigos, nos últimos 200 anos. Entre esses manuscritos estão o Códice Sinaítico, o Códice Vaticano, o Códice Alexandrino, o Códice Ephraemi Rescriptus, bem como vários papiros. Um manuscrito mais antigo não é necessariamente melhor do que um manuscrito copiado em época mais recente, mas até prova em contrário um manuscrito mais antigo, que não resultou de um longo processo de sucessivas cópias, tem maiores chances de conter menos erros de cópia.
Por isso, as edições do Novo Testamento Grego chamadas de ‘críticas’ têm a preferência das Sociedades Bíblicas, em detrimento do assim chamado “texto recebido”, porque refletem o texto tal qual se encontra nos “melhores e mais antigos manuscritos”.
O ‘texto recebido’ foi elaborado por Erasmo de Roterdã, no século XVI, a partir de um punhado de manuscritos, copiados no final da Idade Média. No entanto, em termos de conteúdo, não há diferença substancial entre o ‘texto crítico’ e o “texto recebido”, pois, em geral, aquilo que o ‘texto recebido’ tem a mais reflete ou ecoa o que se encontra em outro lugar na Bíblia”.

Com certeza, o maior grau de diferença nas diversas traduções será encontrado no Novo Testamento, por causa da problemática da definição do melhor texto e mais próximo do original. Contudo, o problema das traduções não param somente na definição de qual o texto se aproxima do original, mas também esbarra na questão da adequação da tradução para os dias de hoje.
Você encontrará traduções com a intencionalidade de adaptação à linguagem mais moderna e algumas oferecendo certo teor interpretativo até. Ou seja, você pode ter adaptações do tipo:
O que não entre pela porta no aprisco das ovelha, mas sobe por outra parte é ladrão e salteador (João 10.1 – Versão Almeida Atualizada)

quem não entra no curral das ovelhas pela porta, mas pula o muro é um ladrão e bandido (Versão: Linguagem de Hoje).

aquele que não entra no aprisco das ovelhas pela porta, mas sobe por outro lugar, é ladrão e assaltante (Versão: NVI).

Mas também pode ter adaptações e ensinos verdadeiramente interpretativos como, por exemplo em Eclesiastes 11.1:
Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás (ARA).

Empregue o seu dinheiro em bons negócios e com o tempo você terá o seu lucro (BLH).

Atire o seu pão sobre as águas, e depois de muitos dias você tornará a encontrá-lo (NVI).
Uma opção mais segura para o crente que não possui treinamento teológico ou exegético, que nada conhece de grego ou hebraico, é ter algumas traduções à sua disposição e procurar compará-las. Por meio de estudos deve escolher uma tradução, carro chefe de sua devoção e manter suas leituras comparativas com as demais.
Em geral, eu prefiro a ARA – Almeida Revista e Atualizada, mas tenho bons colegas que estão dando preferência ao uso da NVI – Nova Versão Internacional, em virtude de sua linguagem mais adaptada.
Contudo, apesar das diferenças das cópias e as diversas traduções, vale a pena considerar que ainda assim, um processo divino está inserido nesta preservação e expansão da Palavra de Deus.
Quanto a mim, esta é a minha aliança com eles, diz o SENHOR: o meu Espírito, que está sobre ti, e as minhas palavras, que pus na tua boca, não se apartarão dela, nem da de teus filhos, nem da dos filhos de teus filhos, não se apartarão desde agora e para todo o sempre, diz o SENHOR (ARA – Isaías 59.21). 
“Quanto a mim, esta é a minha aliança com eles”, diz o Senhor. “O meu Espírito que está em você e as minhas palavras que pus em sua boca não se afastarão dela, nem da boca dos seus filhos e dos descendentes deles, desde agora e para sempre”, diz o Senhor (NVI – Isaías 59.21).

A Infalibilidade das Promessas de Deus
Decorrente também da inspiração, a doutrina da infalibilidade tem um conteúdo mais voltado para o mérito da Palavra de Deus, isto é, o fato de que as orientações nela contidas são o caminho da verdade e obedecer a Palavra é trilhar a vereda correta para a vida.
Porque para Deus não haverá impossíveis em todas as suas promessas (Lucas 1.37).
Pedro, diante de Jesus afirma que “somente Jesus tinha palavras de vida eterna”. Este era o espírito com que a Igreja neotestamentária encarou a palavra de Deus e se manteve firme no conceito de que a Palavra de Deus nunca falha.
A infalibilidade das Escrituras é aquela virtude da Palavra de Deus de ser a verdade, portanto, suas promessas não deixam de se cumprir e o que ela indica como estrada para a vida é o único caminho a seguir. A infalibilidade não se limita somente aos dizeres positivos, mas também aquilo que ela prognostica como ruim.
Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão (Marcos 13.31).
A crença na infalibilidade das Escrituras é a principal alavanca para o temor cristão. Ou seja, o crente confia em Deus e treme do que sua palavra diz, porque sabe que não poderá fugir aos seus preceitos e se segui-los será bem aventurado.
Porque a minha mão fez todas estas coisas, e todas vieram a existir, diz o SENHOR, mas o homem para quem olharei é este: o aflito e abatido de espírito e que treme da minha palavra  (Isaías 66.2). 
Tudo o que as Escritura fala sobre Deus, sobre suas obras, seus intentos, sua vontade para a vida humana etc, tudo isto deve ser recebido com fé e temor, de tal forma que moldemos nossa vida segundo a Palavra.

Conclusão
A Bíblia, portanto, é a Palavra de Deus Inerrante e Infalível em virtude de ser soprada pelo próprio Deus que não pode mentir. Crer na Bíblia e viver segundo o padrão do seu ensino é um grande passo de sabedoria. Falhar em ouvir a voz de Deus e seguir sua orientação é, por sua vez, um passo equivocado.



domingo, 5 de março de 2017

Aula 3 - Prolegomenos - A Doutrina da Inspiração Bíblica e o Testemunho Interno do Espírito

AULA 03
A Doutrina da Inspiração Bíblica
O Testemunho Interno da Escritura


Introdução
Na aula passada, investigamos os valores e as implicações da sobrenaturalidade da Revelação Especial. O ponto que destacamos deste aprendizado é a unidade que há entre os aspectos naturais e sobrenaturais da realidade. Ou seja, devemos considerar que vivemos e nos movemos no meio natural, revestido pela presença e agir sobrenatural de Deus entre nós.
Esta unidade entre naturalidade e sobrenaturalidade é principalmente exemplificada na pessoa de Jesus, o ponto alto da revelação de Deus. Nele, no Homem-Deus, natural e sobrenatural se unem para abrir a porta do entendimento de toda a realidade centrada em Deus, na pessoa de Jesus.
O efeito mais importante da sobrenaturalidade da Revelação Especial de Deus é que ela, embora seja um produto do agir humano, isto é, foi escrita por homens, sua origem é divina, por meio do ato inspirador.
Nesta aula, nosso propósito é apresentar o mecanismo da Inspiração das Escrituras, o testemunho interno das Escrituras sobre sua Inspiração e a avaliar a importância disto para a construção de nossa fé e relacionamento com Deus.

O Sopro de Deus Para a Revelação
O apóstolo Paulo usou uma palavra composta para se referir à inspiração das Escrituras e indicar sua origem divina. O texto de 2Timóteo 3.16, tem uma peculiaridade, o que a Teologia chama tecnicamente de “Hapax Legomena” (uma palavra utilizada somente uma vez no texto bíblico).

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça (2Timóteo 3.16).

A “hápax legomena” deste verso é a palavra grega “Theopneutos” (inspirada por Deus). Essa expressão indica a origem divina da Escritura, sendo ela um resultado o respirar de Deus, ou expirar de Deus para o homem.
O que Paulo deseja que Timóteo compreenda é que a vida cristã é um resultado direto da vontade de Deus apontando para o homem o caminho por meio de sua Palavra. Timóteo deveria confiar nas instruções, exortações, correções e todos os conselhos da Palavra nascida de Deus.

Toda a Escritura é Inspirada
O outro ponto que devemos destacar na percepção de Paulo é que ele compreendia que todo o texto, ou o “graphê” (registro) é resultado deste respirar de Deus ao homem. Paulo desejou que Timóteo confiasse em todo o registro da Escritura e depositasse nele sua esperança de viver para agradar a Deus.
Neste ponto, o que a doutrina da inspiração aponta é que o texto bíblico é totalmente uma obra de origem divina, trazida à realidade natural por meio da instrumentalidade dos homens que ele escolheu para esta tarefa. Pedro corrobora essa visão em sua instrução à sofrida igreja de seus dias.
Sabendo primeiramente, isto: que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação, porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo (2Pedro 1.20-21).
Quando tomavam o texto bíblico em suas mãos (Antigo Testamento), os apóstolos sabiam que estavam lidando com um registro inspirado. No entanto, sabiam que também estavam vivendo um momento especial da Revelação, porque, intuíram que também eles estavam sendo usados para falar da parte de Deus. Veja como Pedro equipara as cartas de Paulo aos Escritos dos profetas, ou “demais Escrituras”.
E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles (2Pedro 3.15-16). 
Por isso é que consideravam que a Igreja estava estabelecida a partir de dois pilares: o fundamento dos profetas e dos apóstolos. Neste sentido, sabiam que estavam sendo usados para anunciar a Palavra de Deus, uma vez que agora, falavam aos homens o que Jesus lhes ensinara.
Amados, esta é, agora, a segunda epístola que vos escrevo; em ambas, procuro despertar por lembranças a vossa mente esclarecida, para que vos recordeis das palavras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador, ensinado pelos vossos apóstolos (2Pedro 3.1-2). 
Por isso, tanto o Antigo quanto o Novo Testamento são aquilo que Paulo chamou de “Toda a Escritura” e deve ser recebido como o texto inspirado, soprado por Deus para seu povo.

As Evidências Externas da Inspiração
As evidências externas da Inspiração são aqueles elementos que constroem a credibilidade das Escrituras. Em geral, se recorre aos achados arqueológicos para comprovar a antiguidade das Escrituras, mas as evidências da inspiração bíblica são aqueles fatos que, uma vez, anunciados nas Escrituras, vieram a se tornar realidade.
As profecias, por exemplo, muitas delas, anunciaram a chegada de Cristo Jesus, muito antes dele nascer e os fatos publicados pela Palavra de Deus não falharam, assim as Escrituras recebiam a credibilidade como Palavra Inspirada por Deus, por jamais falharem.
Nenhuma promessa falhou de todas as boas palavras que o SENHOR falara à casa de Israel; tudo se cumpriu (Josué 21.45). 
A evidência do cumprimento da Palavra de Deus anunciada é a grande evidência externa do texto bíblico. Mas, devemos considerar também o valor que há na grande coesão da história contada nas Escrituras.
Quando notamos que a Bíblia se encaixa em um enredo de Criação-Queda-Redenção e que seus textos se unem formando um todo harmônico apesar de ter sido escrito por autores diferentes, em diferentes condições e épocas, só é possível considerar que há uma mente por detrás deste processo, conduzindo todas as coisas.

O Testemunho Interno do Espírito Santo
O Espírito Santo é o responsável pela ação inspirativa do texto bíblico original. Mas também é o responsável por fazer com que o crente e somente o crente, tenha o discernimento da verdade da Palavra de Deus. A este discernimento especial da parte do Espírito Santo, denominamos “Testemunho Interno do Espírito Santo”.
O próprio espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus (Romanos 8.16).
Este agir interno do Espírito Santo nos faz perceber e apreender o texto bíblico com a convicção de estar diante da verdade. Os apóstolos compreendiam que o Espírito é quem nos convence da verdade.
Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo (João 16.8).
Quando vier, porém, o Espírito da Verdade, ele vos guiará a toda a verdade, porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir (João 16.13).
Para muitas pessoas, a veracidade das Escrituras e sua inspiração seria melhor comprovada por fatos ou evidências externas, pois estas têm a característica mais empírica ou científica. Entretanto, o testemunho que realmente faz diferença na nossa relação com o texto inspirado é aquele que é produzido dentro do ambiente da sobrenaturalidade da Palavra de Deus, quando é aplicada ao nosso coração por meio da obra do Espírito Santo.


Conclusão

Terminamos esta aula com a noção da importância da Inspiração Bíblica para que nossa fé seja fortalecida em confiança e exclusividade de apoio no que a Escritura fala. Também consideramos que esta convicção se fortalece por meio da obra do Espírito Santo agindo em nós, quando nos guia a confiar no que estamos lendo, como sendo Palavra do próprio Deus. 

domingo, 19 de fevereiro de 2017

Aula 2 - Prolegômenos - Naturalidade e Sobrenaturalidade na Bíblia



AULA 02
Naturalidade e Sobrenaturalidade da Bíblia


Introdução
Na aula 01, tratamos da Revelação Geral e Especial, mostrando como existe um relacionamento fundamental entre ambas, que se trata de como ambas e completam e se tornam o fundamento de toda a interpretação da realidade.
Essa realidade que interpretamos pode ser considerada em termos de sua naturalidade. Ou seja, as coisas criadas, que o ser humano interpreta pesando valores e que apontam para Deus, são, em si, uma realidade natural. Contudo, por detrás da realidade natural da Criação e como seu fundamento, existe a sobrenaturalidade, que é a realidade do próprio Deus e que precisa ser considerada como fundamento da naturalidade das coisas, afinal, é a sua origem e sentido.
Quando olhamos o mar o nos deliciamos com sua beleza em termos de sua grandiosidade, força natural, regularidade e a vastidão de seres que segreda, estamos desfrutando da beleza de sua naturalidade. Não obstante, o mar é um elemento da Criação que aponta para o Criador, portanto, aponta para a sobrenaturalidade da realidade que lhe preserva, controla e limita.
Essa mesma relação devemos entender quando nos aproximamos das Escrituras. E por isso, precisamos considerar os valores naturais das Escrituras em companhia constante da sua sobrenaturalidade latente.

Escrita por homens
A naturalidade das Escrituras pode ser primordialmente considerada pelo fato de ser um livro escrito por homens.
O conteúdo bíblico, embora fale até mesmo de coisas que estão além da naturalidade, como por exemplo, o céu, é o resultado do labor natural de homens de Deus.
Visto que muitos houve que empreenderam uma narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os que desde o princípio foram deles testemunhas oculares e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem, para que tenhas plena certeza das verdades em que foste instruído. (Lucas 1.1-4).
Lucas atesta que a obra que escreveu foi o resultado de um empreendimento de pesquisa, a partir da oitiva de testemunhas e análise dos relatos que lhe foram feitos e, portanto, o resultado de um trabalho dentro da ordem natural das coisas.
O Apóstolo Paulo pode ser considerado o sistematizador teológico da fé cristã. Foi ele quem discerniu e ensinou o fundamento da obra da justificação, embora já houvesse suas sementes nos registros do Velho Testamento e nas palavras de Cristo, a clareza desta doutrina vem na obra teológica de Paulo, em suas cartas.
E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles (2Pedro 3.15-16).
Pedro, falando sobre o trabalho do apóstolo Paulo, nos diz que fora o resultado de uma sabedoria peculiar que ele empreendeu ao considerar e sistematizar a doutrina da salvação. A sabedoria de Paulo é um componente natural e os textos que produziu, fruto desta reflexão, devem ser considerados uma obra natural, de um homem sábio.
Da mesma forma, podemos pontuar sobre livros históricos, cujo propósito de registro dos acontecimentos é claramente um labor da ordem natural dos acontecimentos humanos.
Quanto aos mais atos de Salomão, a tudo quanto fez, e à sua sabedoria, porventura, não estão escritos no Livro da História de Salomão?(1Reis 11.41).
O mote constante do Livro dos Reis: “...não estão escritos no Livro da História dos Reis... (14.29; 15.7; 15.23 etc)”, aponta para o fato de que era o produto do registro de observadores, estudiosos da história, do mesmo modo como alguns escreveram a história das guerras jônicas, dos egípcios, dos hititas etc.
Não há nenhum problema em se considerar a Bíblia um livro da ordem natural das coisas, como o fruto do desenvolvimento baseado em aspectos da cultura humana. A Bíblia é um livro escrito por homens.
O problema quanto à consideração da naturalidade da Bíblia começa quando a desconectamos de sua realidade sobrenatural. Ou seja, quando isolamos a naturalidade das Escrituras da sua sobrenaturalidade.

Inspirada Por Deus
Na próxima aula, iremos abordar a “Doutrina da Inspiração” com mais detalhes, procurando explicar melhor o que é e como funciona o ato divino de guiar os seus servos para o registro da Escritura. Aqui, porém, ficaremos no âmbito mais conceitual da inspiração, propondo uma abordagem integral da Escritura, somando a sua naturalidade à sua sobrenaturalidade.
Embora a Bíblia seja um produto da cultura humana, ela não é só um produto humano, ou natural. As Escrituras são resultado de um ato sobrenatural de Deus de se revelar.
Quando Pedro atestou que as cartas de Paulo era fruto de sua sabedoria, ele destacou que esta sabedoria não era meramente o resultado das ligações elétricas do cérebro em contato e observação da realidade, Pedro nos diz que tal sabedoria havia sido “dada” (por Deus) à Paulo.
E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada (2Pedro 3.15).
Ao se referir à “sabedoria que foi dada a Paulo”, Pedro está claramente nos dizendo que os escritos paulinos eram fruto do trabalho intelectual dele, mas que tal capacidade não era meramente natural. O mesmo Pedro, foi testemunha da sobrenaturalidade da realidade, quando no Monte da Transfiguração, viu que o mundo natural é sobreposto por uma realidade sobrenatural e estes estão intimamente unidos. Ele ainda se recorda desta intima relação entre o natural e o sobrenatural na voz que se ouviu no momento do batismo de Cristo.
Porque não vos demos a conhecer o poder e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo seguindo fábulas engenhosamente inventadas, mas nós mesmos fomos testemunhas oculares da sua majestade, pois ele recebeu, da parte de Deus Pai, honra e glória, quando pela Glória Excelsa lhe foi enviada a seguinte voz: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo. Ora, esta voz, vinda do céu, nós a ouvimos quando estávamos com ele no monte santo (2Pedro 1.16-18).  
Neste ponto, o que percebemos é que Pedro está defendo seus escritos e dos outros apóstolos de acusações tais como: é somente uma fantasia ou um devaneio, igual ao dos escritores gregos ou romanos. Pedro, em defesa da sobrenaturalidade do ensino dos apóstolos, apela para o ponto mais concreto de sua observação da intima relação entre naturalidade e sobrenaturalidade, aqueles dois momentos em que o véu que esconde esta relação foi rompido: a voz de Deus que foi ouvida no batismo de Cristo e o Monte da Transfiguração, quando a glória de Cristo foi revelada concretamente e ele, Tiago e João viram.
Temos, assim, tanto mais confirmada a palavra profética, e fazeis bem em atendê-la, como a uma candeia que brilha em lugar tenebroso, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça em vosso coração, sabendo, primeiramente, isto: que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação; porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo (2Pedro 1.19-21).
Pedro usa sua experiência com a sobreposição da realidade sobrenatural à natural para explicar o que realmente é o ensino que ele e os outros apóstolos estavam entregando à igreja: uma revelação da verdade divina nascida em Deus e entregue aos homens por meio naturais, os escritores humanos. Esta é a ideia que ele defende quando diz que os homens que falaram, falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo.

Naturalidade e Sobrenaturalidade Unidas na Bíblia e na Vida
Resumindo um tanto a história do pensamento cristão, podemos dizer que o final do período Medievo trouxe à luz uma forte influência aristotélica sobre a visão de mundo cristã. Dois nomes, vamos destacar neste empreendimento: Tomás de Aquino e Guilherme de Ockam. Estes dois expoentes do pensamento cristão, chegaram à conclusões bem próximas sobre a realidade.
Eles dividiram fortemente a realidade sobrenatural da natural. Tomás de Aquino atribuiu alguma relação à estas suas realidades no momento dos milagres e Ockam simplesmente os tornou incomunicáveis. Aquino trabalhou com ideia de “Natureza e Graça” e Ockam, empreendeu o projeto conhecido como “A Navalha de Ockam”.
Aquino dizia que o mundo da natureza, da ciência natural era tudo o que ocorria na esfera das realidades concretas e o mundo da graça, o sobrenatural, ocorria numa esfera fora do controle humano e que ambos deveriam ser compreendidos separadamente. Ockam, em direção semelhante, defendia que a razão não serve de apoio à teologia, porque esta tem apoio somente na fé.
Estes dois pensadores, claro, tratando seu pensamento com certo simplismo, trabalharam com um certo isolamento entre a realidade material e não material, ou natural e sobrenatural. Eles não negaram ambas, mas as dividiram.
O passo seguinte na filosofia foi a negação da sobrenaturalidade da realidade e a afirmação de exclusividade da naturalidade como a única esfera de existência. Este processo filosófico foi chamado de “naturalismo”.
Portanto, o que vemos em debate nos dias atuais não é nem a sobreposição das duas realidades, mas a real existência da sobrenaturalidade. Portanto, temos de admitir, o cristianismo deu um passo para traz no que diz respeito ao conceito bíblico de realidade.
Temos, assim, tanto mais confirmada a palavra profética, e fazeis bem em atendê-la, como a uma candeia que brilha em lugar tenebroso, até que o dia clareie e a estrela da alva nasça em vosso coração (2Pedro 1.19).
Pedro trata a condição humana natural como sobreposta à realidade sobrenatural, mas nos diz que para que este ponto seja compreendido precisamos vencer as “trevas” que encobrem a nossa visão.

O conceito de pecado como encobrimento da realidade sobrenatural
Um dos pontos que tenho trabalhado nos estudos bíblicos que faço sobre realidade e visão de mundo é o conceito de pecado.
Claro que em sua base bíblica, o pecado é a transgressão da “Lei de Deus”, contudo, o conceito de “Lei de Deus” não pode ser encerrado em um conjunto de ditames do tipo: faça ou não faça.
Pedro está falando da “Lei de Deus” quando se refere às escrituras e aos ensinos dos apóstolos. Portanto, o que estamos tratando aqui é que a Lei de Deus é a “candeia que brilha nas trevas e revela que o sobrenatural e o natural estão ligados”. Ou seja, o pecado é a transgressão daqueles ensinos que nos revelam a ligação entre a esfera natural e sobrenatural da realidade.
Em outras palavras, o que venho pensando sobre o pecado é que o seu principal efeito é que ele nos privou de ver o mundo de uma forma completa, mantendo nosso coração alijado de perceber a ligação entre a Criação e o Criador, entre a naturalidade e a sobrenaturalidade.
Quando, portanto, dizemos que não existe Deus e vivemos neste mundo sem considerar a realidade sobrenatural, da qual Deus é o fundamento, então, vivemos uma “mentira” e não uma realidade. Nossa realidade, quando vivida sem Deus é “ficcional”.
Diz o insensato no seu coração: Não há Deus. Corrompem-se e praticam iniqüidade; já não há quem faça o bem. Do céu, olha Deus para os filhos dos homens, para ver se há quem entenda, se há quem busque a Deus (Salmo 53.1-2).
A falha na consideração integral da realidade, baseada na intima relação entre a sobrenaturalidade e naturalidade é um erro conceitual que a Bíblia chama de loucura. Ela diz que este é o princípio da “ação iníqua”, porque desfruta da realidade criada, sem perceber nela o seu “sentido”, que é apontar para Deus.
As Escrituras Apontam para a Unidade da Realidade
As Escrituras propõem uma abertura de nossos olhos produzida pela obra do Espirito Santo que nos conduz à “verdade”. Portanto, a Bíblia não é só um livro de origem “sobrenatural”, mas um livro que nos guia à sobrenaturalidade como fundamento da “naturalidade” da Criação.  
A ira de Deus se revela dos céus contra toda impiedade e perversão dos homens que detém a verdade pela injustiça; porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre ele, porque deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim como o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato (Romanos 1.18-21).
O ponto distintivo deste texto é que ele mostra que a corrupção do coração humano (mente) produziu um modo de vida que nega a verdade e vive por meio de sua deturpação um tipo de vida iniqua.
O propósito das Escrituras (Revelação Especial), portanto, é a iluminação da nossa mente entenebrecida, nos levando a considerar a realidade como um todo completo e, por meio disto, recuperar uma visão integral da realidade, fazendo com que todas as coisas nos revelem Deus (Revelação Geral).

Conclusão
Quando tomamos as Escrituras para as ler, não podemos nos deter exclusivamente em lê-las como fruto da sabedoria humana meramente considerada. Também não podemos lê-la como uma revelação sobre uma vida espiritual ou sobrenatural que nada tem a ver com o dia a dia. Antes, devemos ler a Escritura como um manual de desvendamento da realidade, uma espécie de guia para que nos movamos em uma realidade total da vida e vivamos a VERDADE.


domingo, 12 de fevereiro de 2017

Aula 1 - Prolegomenos - Revelação Geral e Especial


AULA 01
Revelação Geral e Especial


Introdução
O princípio fundamental da fé cristã é a ideia de “revelação”. Em outras palavras, podemos dizer que sem o conceito de “revelação”, o cristianismo se torna em um mero ato especulativo. Afinal, como o homem poderia realmente descobrir e discernir a existência de Deus sem que este se revelasse?
Em nosso curso sobre a “Natureza da Bíblia” é fundamentado no fato de que toda a Bíblia é a Revelação Especial de Deus e que ela, corroborada pela Revelação Geral, nos mostra a relação que há entre: Deus, sua Criação e o grande plano de redenção.
Portanto, o estudo desta matéria deverá servir de apoio para o entendimento cristão sobre como Deus decidiu usar a comunicação com o homem para conduzir o coração humano a “conhecer” o “mistério” sobre a existência de tudo e leva-lo a retornar a seu Criador em submissão e amor.

Revelação e Racionalidade
Antes de tratarmos dos conceitos de Revelação Geral e Especial, precisamos fundamentar a primordial necessidade do ato divino de revelar-se, que é a condução da racionalidade humana.
Ao criar o homem, diferente de todas as outras criaturas materiais, Deus o fez com a capacidade de crer, por meio de um complexo sistema de racionalidade. A crença humana não é um mero ato do instinto animal de seu ser, ao contrário, ele é movido por uma capacidade de perceber a realidade, avaliar e escolher suas crenças.
Portanto, Deus não desejou apenas existir e agir na vida do homem, mas, muito além disto, planejou que o homem o conhecesse e o amasse pelo exercício da vontade, que se constrói por meio da sua capacidade racional.
Uma das acusações contra a religião, não somente a cristã, é que a “Revelação Divina” foi uma criação da “Racionalidade Humana”. Neste ponto de vista, Deus é o fruto da construção da imaginação racional do homem e, portanto, um devaneio, ou uma forma humana de se projetar para além de si, em um ser que tenha sido criado pelo homem para ser o seu criador e deus.
O cristianismo compreende que esta acusação é completamente válida. Afinal, o homem é realmente capaz de criar deuses, segundo os seus anseios mais profundos e imaginar a sua revelação, usando este processo inverso de “revelação humana sobre a divindade”. Contudo, o cristianismo defende a ideia de que a “Revelação Sobrenatural” de Deus é uma condutora da “racionalidade humana” para a descoberta da realidade de um criador de algo que realmente existe: “A Revelação Geral” ou “Natural”.
Ou seja, a fé cristã é a busca de uma compreensão da realidade criada e concreta, tais como a existência do sol, do mar, das montanhas, do próprio homem, por meio de uma pergunta que só pode ser respondida por meio de uma revelação sobrenatural: quem fez e sustenta tudo o que existe?
Por isso, a racionalidade humana precisa da revelação natural para ser despertada para a necessidade de Deus e conduzida para saber sobre este Deus, por meio da revelação especial. Sem a revelação em sua totalidade, a racionalidade humana está sem rumo existêncial e termina criando um mundo de trevas, onde a verdade não é alcançada, mas criada segundo as inclinações do desejo humano.

Revelação Geral
Os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras das suas mãos. Um dia discursa a outro dia, e uma noite revela conhecimento a outra noite. Não há linguagem, nem há palavras e deles não se ouve nenhum som; no entanto, por toda a terra se faz ouvir a sua voz, e as suas palavras até aos confins do mundo. Aí pôs uma tenda para o sol, o qual, como noivo que sai dos seus aposentos, se regozija como herói, a percorrer o seu caminho. Principia numa extremidade dos céus e até à outra vaio o seu percurso; e nada refoge ao seu calor (Salmo 119.1-6).
A primeira parte do Salmo 19 é um hino maravilhoso sobre a Revelação Geral. Esta se define por ser aquele modo de revelação divina por meio das coisas criadas. Aqui, o salmista, trabalha com a figura de que, embora não sejam usadas palavras, o processo de revelação sobre a realidade da vida se dá, por meio das leis que foram postas na existência das coisas.
O sol, assim como os astros que brilham na noite, na ausência de sua luz, seguem leis inquebráveis, que nada, nem ninguém pode resistir. O princípio que o salmista defende é que a simples observação desta realidade tão regular, indica que uma “mão” maior que o firmamento conduz estas coisas. Uma outra forma de afirmar esta verdade é que se existe uma lei que governa estes astros, ela aponta para um legislador maior que os astros.
A história que a natureza conta todos os dias é sobre este legislador. Talvez por isto, ao continuar o salmo, o salmista tenha escolhido a palavra “lei” para se referir à “Revelação Especial” que é a Palavra registrada de Deus.

Revelação Geral Sua Suficiência e Insuficiência
Em geral, os teólogos reformados, consideraram que a “Revelação Geral” é importante, mas “insuficiente” para levar o homem ao conhecimento de Deus. Meu professor de Teologia Sistemática, Dr. Heber Carlos de Campos, afirmava que o ponto que deveríamos considerar não ser a “insuficiência” da Revelação Geral, mas qual era o seu propósito.
Portanto, o que precisamos pensar é que a Revelação Geral cumpre, sem problema algum e sem nenhuma limitação, o seu papel revelacional. A questão que deveremos debater, portanto, é dupla: a) qual é o propósito desta revelação; b) qual a capacidade do homem de compreendê-la.
A ira de Deus se revela dos céus contra toda impiedade e perversão dos homens que detém a verdade pela injustiça; porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre ele, porque deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim como o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; porquanto, tendo conhecimento de Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças; antes, se tornaram nulos em seus próprios raciocínios, obscurecendo-se-lhes o coração insensato (Romanos 1.18-21).
O que podemos aprender neste texto sobre o propósito da revelação geral é que ela é suficiente para gerar o temor a Deus por meio de uma clara noção de sua divindade e poder, além de nos dar princípios lógicos sobre outros dos seus divinos atributos.
Um homem pode olhar para a natureza e pressupor a existência de um Deus legislador. Portanto, um Deus de ordem, de poder para criar e aplicar leis, racional para discernir entre uma coisa e outra, além de perceber a riqueza e a beleza do seu cuidado para com os humanos, quando este Deus cria coisas tão benéficas e necessárias.
A Revelação Geral, segundo o texto, é suficiente para gerar acusação contra o incrédulo. Portanto ela também cumpre o propósito de ser a razão da condenação daqueles que, em lugar de reconhecer a divindade de Deus, se desviam do Deus verdadeiro e criam suas próprias explicações, deixando de adorar a Deus.
Voltando um pouco o olhar para a capacidade do homem de compreender a revelação geral. O que vemos no texto é que a racionalidade humana é suficientemente capaz de compreender esta revelação, mas, os efeitos danosos da queda sobre a mente humana, produziu um coração tão distante de Deus que os raciocínios do coração desviam o homem da verdade, preferindo leva-lo a crer na mentira.
Portanto, quando o homem percebe a realidade do sol, do seu calor e da lei que está por detrás da sua existência real, e elabora um conceito idólatra de que o sol é Deus, ou de que o mar criou o sol, ou coisa semelhante, ele está deturpando a realidade e mostrando os compromissos apóstatas do seu coração. Detendo a verdade, por meio de um ato de injustiça.
O problema da racionalidade humana não é sua incapacidade ou insuficiência é a sua corrupção pecaminosa. Contudo, devemos dizer que a revelação geral cumpre claramente o seu propósito e desperta o homem para a necessidade de ir além de si mesmo. Contudo, devemos considerar que o pecado, como fator desestruturador e corrompedor do centro da racionalidade humana, tornou o homem incapaz de chegar a Deus por meio da verdade revelação pela natureza e, de certa, forma, a Revelação Geral sozinha, não é suficiente para conduzir esta racionalidade caída a Deus.

Revelação Especial e sua Necessidade
Diante da impossibilidade do homem caído, de mente corrompida, chegar à verdade de Deus por meio exclusivo da Revelação Geral, aprouve a Deus manifestar a verdade por meio de uma Revelação Especial.
A lei de Deus é perfeita e restaura a alma; o testemunho do Senhor é fiel e dá sabedoria aos símplices. Os preceitos do Senhor são retos e alegram o coração; o mandamento do Senhor é puro ilumina os olhos. O temor do Senhor é límpido e permanece para sempre; os juízos do Senhor são verdadeiros e igualmente justos (Salmo 19.7-9).
Ao menos quatro das expressões usadas sobre o poder da Revelação Especial de Deus apontam para o seu papel de redenção da percepção humana sobre a realidade:
Restaura a alma – o salmista trabalha com a ideia de que, embora haja revelação divina propositiva em toda a natureza criada, a alma do homem só pode ser restaurada, mediante a ação da lei de Deus. Aqui ele está pressupondo que o pecado  corrompe o homem e o desvia de Deus, portanto, só pode ser restaurado se aprender o caminho perfeito da lei de Deus.
Dá sabedoria aos símplices – a sabedoria que trata esta expressão é a capacidade de compreender a vida. A ideia é que a Lei de Deus aponta para Deus de tal forma que a racionalidade humana guiada pelo testemunho da palavra compreende a vida melhor que o mais os mais cultos. O homem símplice, tratado no salmo aponta tanto para o indouto, como também para o que se caracteriza por um temor puro diante de Deus, aquele que se deixa guiar.
Alegram o Coração – O salmista compreende que um coração que vive na obscuridade e não consegue chegar à luz do conhecimento de Deus não pode ser realmente feliz. Afinal, qualquer que se alegra na mentira, não se alegra de fato. Aqui, então, ele diz que o Deus conduz o coração humano para a verdadeira alegria, porque é alegria na retidão.
Ilumina os olhos – seguindo o mesmo conceito da obscuridade, ele diz que o que realmente acontece com o homem que se aproxima para crer na Revelação Especial de Deus é que seus olhos são abertos para a verdade. Portanto, como uma luz que abre e revela tudo que realmente há ao redor, faz com que o homem abra o seu entendimento para a realidade centrada em Deus.
A Revelação Especial, portanto, é o ato de Deus de vir ao homem e suprir sua impossibilidade de ver a verdade sobre toda realidade, por causa da corrupção do pecado, e dar-lhe um coração capaz de discernir a realidade centrada no próprio Deus.

Ela é necessária para fazer o homem compreender a revelação geral e o Deus que está por detrás dela. Portanto, ela é complementar à primeira.