Introdução
Nos estudos anteriores, trabalhamos a questão do pecado focalizando dois aspectos: estado e condição.
O estado de pecado é provocado pela nossa ligação com Adão. Por causa do pecado dos nossos primeiros pais, mais especificamente de Adão, toda a raça humana foi colocada em um estado de pecado, o que nos foi imputado pelo Supremo Juiz, quando Adão falhou na prova, na qual nos representava.
Todos nascem com o pecado original pois este é o estado a que chegamos neste mundo. Mas este pecado original não é neutro em nós, ele produz uma condição, a condição pecaminosa.
Como fruto do nosso estado caído e nossa condenação. Recaiu sobre o gênero humano também uma maldição. O estado de pecado gerou também a corrupção da natureza humana. Então, o homem que havia sido criado santo e reto, perdeu a sua justiça original, o que implicou na consequente perda de sua santidade original e sua capacidade de adquirir o conhecimento verdadeiro sobre Deus.
A condição em que nos encontramos é de pecaminosidade de nossa natureza. Além de termos perdido os predicados da justiça original, assumimos uma inclinação natural para o que é mal, isto é, para a rebelião contra Deus.
O nosso estudo de hoje tratará de um dos aspectos mais importantes desta corrupção da natureza humana, qual seja, a corrupção da mente do homem ou, como preferem os teólogos, os efeitos noéticos do pecado.
Devemos lembrar que a corrupção da natureza humana não se resume nos efeitos noéticos do pecado. Há outros efeitos do pecado sobre a natureza humana, como por exemplo a degeneração do corpo. Podemos considerar as doenças como parte do juízo condenatório de Deus sobre o homem e parte da maldição que recaiu sobre nós, por causa do pecado.
Só para melhorar o esclarecimento deste ponto. Nem toda doença é resultado direto do pecado pessoal. Entretanto, toda doença é efeito do juízo de Deus sobre nós. Ou seja, por causa do juízo de Deus, fomos afetados com o processo de degeneração do nosso corpo. Mas, este não é o assunto de nosso estudo hoje.
A Mente Humana Era Preparada Para Adorar a Deus e Buscá-lo
Antes de falar dos efeitos pecado sobre a mente humana, vamos voltar um pouco e falar sobre a estrutura perfeita da criação da mente humana.
A Mente Humana Foi Criada Para Estruturar a Realidade em Deus
Deus nos criou e nos distinguiu de todo o restante da Criação material ao conceder-nos racionalidade, uma mente pensante e capaz de estabelecer relações de juízo de valor. Isto é, Deus nos concedeu a capacidade de perceber o mundo ao nosso redor e até mesmo o próprio Deus, estabelecendo vínculos de valor com toda a realidade ao nosso redor.
Portanto a nossa relação com Deus, em particular, não seria apenas uma relação de adoração passiva, mas ativa. A mente humana seria capaz de discernir Deus e aprender sobre Ele. A consequência natural desta relação de conhecimento é que adoraríamos a Deus e o amaríamos sobre todas as coisas, pois todo o conhecimento verdadeiro adquirido sobre Ele nos mostraria as suas mais ricas e belas perfeições.
Sensus Divinitatis - Criados Com Sede de Deus
Além de termos sido criados com a mente funcional, capaz de aprender verdadeiramente sobre Deus, nossa mente foi criada com esta intencionalidade, ou seja, o ser humano foi criado com uma natural sede de Deus, o que chamamos de “senso da divindade” (sensus divinitatis).
Em outras palavras, a mente humana estava configurada para estruturar toda a realidade a partir de Deus e apreender o significado de tudo de forma teocêntrica. Tudo nos levaria a pensar em Deus e considerá-lo. Consequentemente, tudo nos levaria a adorar a Deus e amá-lo.
Semen Religiones - Criados Para Buscar a Deus
Outro aspecto do estado de perfeição criacional do homem é que a mente humana, não somente tinha esta inclinação natural de pensar em Deus, mas fora criada com a habilidade natural de buscar o verdadeiro conhecimento de Deus, o que chamamos de “semente da religião” (semen religiones).
Esta capacidade religiosa implicava em que o homem não somente perceberia Deus na estrutura da Criação de forma somente acidental, mas lhe conferia o prazer de buscar ativamente o conhecimento de Deus. O homem estaria com a mente programada para procurar meios de conhecer a Deus.
Podemos dizer que o homem tornaria a sua vida diária um ato de busca de Deus em tudo. Ele, em tudo o que realizasse, se disporia à mais elevada atividade do ser humano, conhecer a Deus. Cultivar o jardim seria apenas um meio de buscar conhecer a Deus e consequentemente adorá-lo na beleza de todas as suas perfeições.
Os Efeitos Noéticos do Pecado
A palavra “nus” (mente em grego) é a raiz desta terminologia. Então, “Efeitos Noéticos do Pecado” é equivalente a dizer: efeitos do pecado sobre a mente.
Particularmente, penso que os mais desastrosos efeitos do pecado sobre a natureza humana e a maior de todas as corrupções dela aconteceram sobre a mente humana.
Toda a nossa capacidade de perceber Deus e adquirir conhecimento verdadeiro sobre Ele foi completamente comprometida. Por causa do pecado, a nossa estruturação da realidade foi afetada e a nossa mente não mais concebe Deus no centro de todas as coisas. Nasceram na nossa mente os processos idolátricos.
O amor último “egolátrico”
Na base criacional perfeita, nosso amor último seria a Deus. A Ele amaríamos de todo o nosso coração. Faríamos isto de maneira natural e buscaríamos conhecê-lo mais e mais e, como resultado disto, O amaríamos ainda mais. Deus seria o nosso amor último, isto é, a base da nossa existência. Toda a nossa vontade seria determinada pelo nosso amor a Deus.
O amor último é, portanto a base de todos os nossos desejos. É o nosso amor último que nos move e promove a nossas escolhas. Mas, entre os efeitos do pecado sobre a nossa mente, encontramos a mudança do nosso amor último.
Surgiu, no lugar do amor último a Deus, o amor último idolátrico. O homem, que se afastou de Deus por causa do pecado, transferiu a base do seu amor do Criador para a criatura e passou a amar de forma última a si mesmo. O homem tornou-se um ser “egolátrico”.
Na verdade, o homem transferiu a raiz de sua vontade para o amor a si mesmo, ele tornou-se deus para si. O pecado interferiu no modo como a mente humana buscava sentido em todas as coisas e produziu um amor último egolátrico, fazendo com que o homem tudo queira e tudo compreenda a partir de si mesmo e não mais a partir de Deus.
A egolatria é, portanto, o modo natural do homem em estado e condição de pecado relacionar-se com a realidade e até mesmo com o seu Criador. Este amor último, agora transferido para si mesmo, tornou-se um problema para o homem, afinal o homem não foi criado para ser assim.
A mente humana é uma fábrica de ídolos
Como dissemos, a mente humana foi criada com um senso da divindade e uma semente de busca de Deus. Como o efeito do pecado mudou o amor último do homem e este passou a ser o seu próprio Deus, surgiu também um problema existencial: a mente humana não suporta a ideia de buscar a si mesma como deus, pois esta possibilidade é incompatível com a sua estrutura criacional do sensus divinitatis e semen religiones.
A saída da mente racional humana foi a criação de ídolos, que sirvam de ícones de seu amor último. É assim que surge a idolatria, o culto a ídolos. Por isso é que dizermos, repetindo o grande João Calvino, que o coração do homem é uma fábrica de ídolos.
Estes ídolos são apenas veículos do amor do homem por si mesmos. Devemos entender que os ídolos são ferramentas que disfarçam o amor último dos homens por si mesmos, concedendo à sua mente uma saída para a inconsistência criacional da egolatria.
Ídolos físicos e ídolos emocionais
Quando falamos em ídolos, sempre pensamos naqueles que são esculpidos em madeira, gesso ou outros materiais ou simplesmente deuses preenchidos por fisicalidade. Estes ídolos são apenas efeitos da nossa rebelião contra Deus e complementam a sede humana de amar a si mesmo, afinal, representam projeções de nossas pretensões.
Um egípcio que adorava ao Deus Nilo, na verdade havia produzido um deus que satisfazia sua necessidade de ser próspero. Como não poderia, por causa dos efeitos noéticos do pecado, admitir que Deus era a fonte da prosperidade, mas se desviava desta realidade, eles adoravam o Nilo como sendo o deus que lhes concedia fertilidade e produtividade.
Ídolos emocionais estão por detrás de ídolos físicos e, muitas vezes, aparecem sozinhos no processo idolátrico da mente humana.
O ser humano, como já dissemos, colocou o seu amor último em si mesmo. Mas, como não pode dizer para si: “eu sou meu deus”; reveste sua idolatria com ídolos, que procuram justificar a sua rebelião contra Deus.
Tomemos como exemplo o hedonismo. Este tipo idolátrico elevou a necessidade do homem de sentir prazer na vida à condição seu deus. Em outras palavras, seu sendo de uma divindade e sua necessidade de buscá-la transitou de Deus e sua busca por meio do conhecimento, para a busca do prazer, justificado pela simples necessidade pessoal.
Deuses emocionais, podem se utilizar de deuses físicos ou não. Neste último caso, eles se apropriam de sistemas mentais. Um bom exemplo é o ateísmo.
No ateísmo, o processo idolátrico de amor último por si mesmo não pode eleger um deus físico como seu ícone e veículo de adoração. Afinal, ser ateu significa não admitir nenhum deus para si.
Então, o ateu terá de justificar a sua rebelião contra Deus, sempre escondendo o seu amor por si mesmo. O seu modo de agir é o de eleger uma ideia como o seu deus. Um bom exemplo de como isto pode acontecer é o ateísmo científico. Este nomeia a ciência como a sua justificativa “lógica” para a inexistência de qualquer deus, qualquer divindade.
Rebelião do Coração
Entre os efeitos noéticos do pecado e o seus resultados mais práticos está a rebelião contra Deus. A rebelião contra Deus é a base de toda a estruturação da mente pecaminosa. É por causa desta rebelião e o desejo de ver-se livre da estruturação de todas as coisas em Deus que o homem luta.
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Rev, boa noite, quando Paulo em Romanos 1:20 diz que os homens são indesculpáveis é por causa de ele não conseguir reconhecer o que está escrito em Salmos 19? ou seja, como o homem foi criado para adoração e pelo pecado foi apartado de Deus, sua mente deveria reconhecer, pelo fato da criação de todas as coisas, que existe um Deus soberano que a tudo rege? ou tem algo mais? Espero ter sido claro em minha pergunta.
ResponderExcluirAbraços.
Alex Amancio
Isso mesmo, apesar da estrutura do pensamento humano ter sido alterada com o pecado e, por isso, se desvia dele, a realidade de um Deus Soberano ainda é a única verdade, que está revelada na Criação. Então, a verdade está lá, o homem não a vê, por culpa de seus pecados, que embaçam a Criação e, portanto, são os únicos culpados de não ver.
ResponderExcluirEssa é a relação de Romanos 1 com o Salmo 19 sim. Em Romanos 1, você lerá também, que se tornaram nulos em seu próprio entendimento e se julgavam sábios, quando, na verdade, eram loucos.
Muito bom o seu link de um texto com o outro!! Isto é ótimo!!! Abraços...