Introdução
O
pecado é o maior de todos os problemas do ser humano. Por causa da sua
presença, a vida humana funciona debaixo de uma estrutura invertida, onde o
homem procura ser o centro de todas as coisas e rejeita a proeminência do
Criador.Para
que o homem viva de uma maneira que agrade a Deus é necessário o
restabelecimento da estrutura criacional original e trazê-lo de volta ao
funcionamento teocêntrico de sua vida.A redenção insere na vida humana duas realidades: a primeira é a garantia da vitória sobre o pecado (justificação); a segunda é a necessidade de fazer morrer a velha natureza pecaminosa que ainda insiste em nos fazer viver egocentricamente (santificação). Esta última é precisamente uma ação que a homem pode e deve participar.Estudar a respeito da soberba, investigando o lugar que ela ocupa no sistema egocentrado de vida, proporciona uma maior capacidade de realinhamento de nossa disposição de viver teocentricamente e agradar a Deus. Nesta lição vamos considerar o que é necessário saber e fazer para que a soberba não nos domine.
I. Definindo ontologicamente a soberba
Ontologico é aquilo que diz
respeito à natureza do ser. Definir ontológicamente a soberba é estudar como
ela está presente na natureza humana. Vamos nos limitar a entender alguns
aspectos ontológicos da soberba na experiência humana.
A. O
que é a soberba
A palavra grega
“superbia” recebe algumas traduções no texto bíblico: soberba, orgulho,
altivez, entre outros. Agostinho de Hipona, um dos teólogos mais importantes do
cristianismo, entendia que a “superbia” (orgulho, soberba) estava na base de
todos os outros pecados e definia esse mal como o “encurvamento do homem a si
mesmo”.
A soberba é
uma inclinação do homem a si mesmo, um sentimento de autoamor idolátrico que
transporta a mente humana para uma forma autocentrada de pensar. Comumente ela
é reconhecida pelo exceço de autovalor, mas sempre o soberbo é aquela pessoa
que conta vantagens de si mesmo. Algumas vezes, a soberba se esconde por detrás
de desculpas como “honra”, “bem estar”, etc.. e por isso, sabendo que a soberba
muitas vezes se disfarça, o salmista clamava: “...também da soberba guarda o
teu servo” (Sl 19.12-13). O perigo que o salmista identificou é que a soberba
poderia dominá-lo.
B. Como
a soberba veio fazer parte da experiência humana
A soberba
sobreveio ao homem quando o pecado entrou no mundo. A tentação do Jardim do
Éden consistia primordialmente de uma negação da submissão à ordem de Deus e
numa tentativa de um viver independente.
Quando a
serpente ofereceu o fruto à Eva usou dessas palavras: “...como Deus, sereis
conhecedores do bem e do mal” (Gn 3.5.b). O homem desejou demarcar os seus
próprios limites.
Deus havia
dado toda a liberdade para o homem: “...de toda árvore do jardim, comereis
livremente” (Gn 2.16), entretanto, essa liberdade era limitada pela vontade do
próprio Deus e isto ficou simbolizado na proibição de comer da árvore do
conhecimento do bem e do mal. O homem, no entanto, rejeitou essa demarcação de
desejou uma liberdade autônoma, centrada em sua própria vontade (Gn 3.6).
Homem e
mulher foram despertados para um desejo novo, que violava a vontade de Deus e
começaram uma relação com a Criação que tinha como centro a sua própria vontade
e autoamor. Antes, a respeito da daquela árvore diziam: “Deus disse: dele não
comereis, nem tocareis nele” (Gn 3.3), mas no verso seis o que se destaca é que
retiraram Deus e perceberam a árvore sem Deus: “vendo a mulher que a árvore era
boa... agradável... e desejável”.
A soberba
havia lançado suas raízes. Um autoamor idolátrico e a vida centrada no ego
ocupara espaço na mente do homem que foi dominado e sucumbiu. Foi assim, que a
estrutura criacional fora invertida e o homem passou a buscar a si mesmo em
lugar de Deus (Sl 14.3; Rm 3.10-12).
Desde então,
arrogantemente o homem se tornou rebelde e resistente ao governo de Deus (Sl
2.2-3). Ao inverter a ordem criacional, a soberba conturbou todos os tipos de
relacionamento e dessa forma desequilibrou todos os tipos de estruturas de
autoridade e limites que se devem respeitar. O homem passou a existir como um
ser “encurvado para si mesmo”, na busca de seus próprios interesses e propenso
a buscar posições e desejar coisas elevadas para si mesmo (Gn 11,4).
C. Onde
a soberba atua na natureza humana.
Como a
soberba exerce o seu controle sobre o homem e onde ela atua para que o domine?
Conhecer o método da ação da soberba nos permite também preveni-la e cuidar
antes que se torne efetiva em nossas ações.
Em Marcos
7.1-23, Jesus apresenta uma importante discussão sobre o poder do pecado na
vida do homem. Fariseus e escribas acusavam os discípulos de Jesus de não
andarem segundo as tradições, pois comiam sem se purificar antes (Mc 7.5).
Usando o exemplo da quebra do quinto mandamento (Mc 7.10-13), Jesus responde
dizendo que o problema da contaminação do pecado não ocorre de fora para
dentro, por meio da ingestão de alimentos, mas acontece de dentro para fora,
por aquilo que sai do homem, isto é, as suas mais secretas intenções (Mc 7.15).
Na conclusão
dessa discussão com os líderes judaicos, Jesus apresenta o ponto central da
atuação do pecado: o coração (Mc 7.21-23). A sede da vida interior do homem
está contaminada. Então, como uma nascente de rio, o coração contaminado com o
pecado espalha o resultado dessa contaminação por tudo o que o homem faz. Por isso,
o sábio aconselha que se tenha prioridade em guardar o coração (Pv 4.23).
Na descrição
apresentada por Jesus, encontramos a “soberba” (Mc 7.22). Ela atua a partir do
coração humano e, por isso mesmo, domina o homem contaminando as ações,
pensamentos, desejos humanos. Cuidar do coração é fundamental, por isso, o
salmista se justifica diante de Deus: “...não é soberbo o meu coração” (Sl
131.1).
II.
Os prejuízos da soberba
A
soberba, ou o orgulho pecaminoso, produz muitos males. Seu poder contaminador é
muito grande e influencia fortemente as ações humanas. Quando o ser humano é
conduzido pela soberba do seu coração trilha uma estrada onde colhe muitos
prejuízos.
A. A
soberba prejudica o relacionamento com o próximo.
Um dos casos bíblicos mais conhecidos
sobre a ação da soberba humana é o episódio entre Caim e Abel (Gn 4.1-8). Caim,
conduzido pela soberba do seu coração, não se inclinou a Deus para ouvir as
instruções do Senhor (Gn 4.7). Dominado pela soberba do coração matou Abel,
como uma forma de autoafirmação.
A soberba influencia o coração
humano a pensar egocentricamente e, por isso, usa a ganância como pensamento
matriz da relação humana. Pensando em si mesmo, o soberbo não se conduz pelo
mandamento de amar o próximo, mas é o autoamor idolátrico que o comanda. Por
isso, os seus relacionamentos com o próximo são muitíssimo prejudicados.
A Bíblia fala que os soberbos
perseguem o próximo (Sl 140.5); vivem em contendas (Pv 13.10); são arrogantes
(Pv 21.24); violentos (Sl 73.6; Is 13.11); mentirosos (Sl 59.12; 119.69);
incapazes de agir com misericórdia (Ez 16.49) etc. Enfim, a soberba prejudica o
homem no seu relacionamento com o próximo.
Por causa da soberba, os homens
têm dificuldade em ajudar o próximo, perdoar, valorizar o outro e desenvolver
um relacionamento sadio sem pensar em tirar vantagens pessoais. O soberbo, por
pensar egocentricamente, não consegue amar o próximo com a atitude voluntária
que a palavra de Deus exige (Mt 22.39; Fp 2.3-4).
B. A
soberba prejudica o relacionamento com Deus.
A inversão dos valores
criacionais faz o soberbo retirar Deus do centro de sua existência. Ainda que
ela tenha algum respeito a Deus, a inclinação do coração do soberbo o afasta de
fazer de Deus a sua prioridade. Na verdade, ele tenderá a considerar Deus como
um instrumento de sua vontade egocêntrica.
A soberba induz o homem a resistir
à vontade de Deus, por não admitir que Deus o domine ou limite (Sl 2.2-3; Jr
18.11-12). O coração do soberbo não consegue abrigar a ideia de se submeter a
Deus e, por isso, Deus oferece resistência ao soberbo (1Pe 5.5; Tg 4.6).
Quando a soberba dirige o
coração do homem, ele rejeita a Lei de Deus e tenta fazer o seu próprio caminho
(2Cr 26.16-19; Ne 9.16). Desta forma, o relacionamento entre o soberbo e Deus
pode seguir duas premissas: a rejeição total de Deus (Sl 10.4) ou a tentativa
de usar a religião como um método de autossatisfação (Am 4.4-5; Is 29.13-16).
O soberbo entra em conflito com
o Altíssimo e, por não se inclinar e submeter a Deus, está posto em lugar de
grande risco de destruição (Sl 73.3-9, 18; Pv 16.18-19). A soberba prejudica
grandemente o relacionamento do homem com Deus.
C. A
soberba traz prejuízos para a própria pessoa.
O soberbo, por causa do
egocentrismo, não confia nas pessoas e não é solicito em ajudá-las. Também, por
causa da sua contínua resistência a Deus, não sente o prazer e o consolo da
companhia de Deus. Por isso sofre pessoalmente em um tipo de vida incerta,
insegura e muito solitária. A soberba, portanto, oferece grandes prejuízos à
própria pessoa.
Esses prejuízos pessoais do
soberbo são aumentados quando sua soberba recebe a necessária disciplina que
vem de Deus (Is 2.12; Jó 40.12). A humilhação é o caminho final dos soberbos,
que são arruinados por causa da altivez do seu coração (Pv 16.18). Herodes, o
soberbo rei que perseguiu e matou Tiago, morreu de forma surpreendente (At 12.21-23);
Nabucodonosor foi humilhado, até que reconheceu o Deus Altíssimo (Dn 4.28-37;
5.18-21); Uzias, depois de ter sido ajudado por Deus, foi humilhado por causa
da sua soberba (2Cr 26.16-21). Esses são alguns exemplos do prejuízo que advém
sobre todos os que se deixam conduzir pela contaminação da soberba.
III. Como lidar biblicamente com a soberba?
O objetivo de toda a Lei de
Deus é nos fazer amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a nós
mesmos. Isso mostra que a soberba não deve ter lugar na vida do crente.
Evidentemente, Deus agirá para retirar a influencia da soberba em nosso coração
e a Escritura estabelece os princípios deste agir divino.
A. Não
negue, nem “tape o sol com a peneira”
Às vezes, as
pessoas tentam se convencer de que suas atitudes não são fruto da soberba do
seu coração. Procurarm justificar seus atos com frases do tipo: “preciso me
valorizar” ou “tenho um pouco de orgulho próprio” etc.. É possível que algum
tipo de orgulho seja aceitável, como o orgulho pelas realizações de um filho ou
as próprias, mas a soberba produz um tipo de orgulho pecaminoso diferente, que
faz a pessoa a pensar e agir contrariamente à Lei de Deus.
Não
precisamos negar que algumas vezes rejeitamos a ajuda a alguém ou resistimos à
vontade de Deus por causa do orgulho pecaminoso. Reconhecer que o pensamento ou
a ação foi fruto da soberba do coração é o primeiro passo para o arrependimento
e até a prevenção de pecados (Sl 32.1-3).
É dessa
perspectiva do reconhecimento do pecado que Tiago escreve no capítulo 4 de sua
carta (Tg 4.1-4). Ao reafirmar a oposição entre Deus e o soberbo (Tg 4.6),
Tiago exorta a sujeição a Deus como saída para o homem.
B. Sujeição
a Deus
A sujeição a
Deus é uma atitude mental que irá ajudar a prevenir ou corrigir a soberba.
Muitas vezes, Deus ordena a história de nossa vida para nos ensinar o caminho
da sujeição a ele (Dt 8.2-3).
O soberbo
procura a autoafirmação e exaltação pessoal e nesse caminho colhe muitos
prejuízos. Mas, aos homens que se sujeitam a Deus, submetendo-se à sua vontade,
o próprio Deus é quem os exalta (1Pe 5.6).
C. Cultivar
a humildade e o amor
“Deus resiste
aos soberbos, mas dá graça aos humildes” (Tg 4.6). Assim como Tiago, Pedro
também indica a humildade como a atitude a ser cultivada para que a soberba não
domine o coração: “...cingi-vos todos de humildade” (1Pe 5.5).
O cultivo de
uma atitude humilde é um ato de obediência que previne que a soberba do coração
domine o homem. Voltando ao episódio de Caim e Abel, a proposta de Deus para o
filho mais velho de Adão foi que tivesse uma titude humilde e repreendesse o
seu próprio coração.
A humildade
é desenvolvida em meio a uma consideração séria da nossa dependência de Deus
(Tg 4.7-8a). Também é fortalecida por meio de um grave senso dos pecados, que
nos conduz a um verdadeiro arrependimento (Tg 4.9-10; Os 5.15; 2Co 7.10).
O resultado
natural da humildade é a disposição para amar o próximo. O amor é o cumprimento
da Lei (Rm 13.8) e a prática do amor nos ajuda a prevenir toda a soberba. Essa
é a instrução do apóstolo Paulo em Romanos 12.
Inicialmente
o apóstolo propõe que a nova vida que agrada a Deus (Rm 12.1) inplica em uma
atitude humilde de moderação (Rm 12.3). Essa atitude é seguida de um serviço de
amor ao outro no uso dos nossos dons em benefício do nosso próximo (Rm 12.16).
O amor surge no lugar da soberba e nos ajuda a vencê-la.
D. Imitar
Jesus
O maior e
mais completo exemplo de humildade é Jesus. Paulo, na carta aos Filipenses, nos
convoca a imitar o seu exemplo: “Tende em vós o mesmo sentimento que houve
também em Cristo Jesus...” (Fp 2.5-9).
Paulo nos
chama a desenvolver o mesmo comportamento humilde de Cristo Jesus e aprender,
se necessário, a abrir mão até mesmo de nossos direitos para que uma atitude de
humildade nos aproxime de Deus e do nosso próximo (Fp 2.3-4).
O
comportamento humilde vai esvaindo as forças da soberba e sua influência sobre
nossa natureza. Nosso coração deve ser guardado humilde, por isso, a oração do
salmista, mais uma vez é de grande importância: “Também da soberba guarda o teu
servo, que ela não me domine; então, serei irrepreensível e ficarei livre de
grande transgressão” (Sl 19.13).
Conclusão
A soberba é
fruto do pecado que atingiu toda a natureza humana. Atuando em nosso coração,
ela nos afasta de Deus, do nosso próximo pela busca egocêntrica da
autoafirmação e busca da independência em relação a Deus.
Sabendo que
ela atua no coração humano e, por isso, tem o poder de contaminar todos os
pensamentos e ações, devemos trabalhar diligentemente usando todos os recursos
que Deus disponibilizou em sua palavra para que a enfrentemos.
O melhor
caminho é começar a analisar se a soberba está espalhando a sua influência em
nossa vida e procurar refrear essa ação. Para preveni-la, devemos buscar a
Deus, por meio da oração e da imitação de Cristo, desenvolvendo uma atitude
humilde e de amor.
Um viver
teocêntrico, que agrada a Deus, depende de uma atitude sensata de abandono da
soberba.
Aplicação
Procure
conversar com outras pessoas a respeito de momentos em que agiram ou pensaram
de forma soberba e como corrijiram essa atitude. Fale sobre os efeitos ruins da
soberba e como é possível evitar muitos males se ela for abandonada.
Proponha
ações práticas que ajudem a promover a interação com o próximo, de tal maneira
que o amor possa ser exercitado na igreja, família e em meio à comunidade em
que você vive.
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