domingo, 12 de março de 2017

Aula 4 - Prolegomenos - Inerrância e Infalibilidade das Escrituras



AULA 04
Inerrância e Infalibilidade das Escrituras


Introdução
Em nossa aula anterior tratamos do tema da “Inspiração das Escrituras”. Embora não tenhamos desenvolvido tecnicamente o tema, trabalhamos principalmente o fato da Bíblia ser um livro originado na “mente divina” e “soprado” (teopneumatos – inspirado) ao homem. Nossa ênfase foi dada ao modo como os autores bíblicos, profetas e apóstolos, eram claros em nos dizer de sua compreensão desta origem divina e como instruíam o povo de Deus, a Igreja de Cristo e confiar e praticar a palavra.
Uma decorrência necessária da doutrina da Inspiração das Escrituras é a sua inerrância e infalibilidade. Ou seja, precisamos considerar que se Deus soprou a verdade aos homens, esta verdade soprada deve ser recebida com a confiança de vê-la como a instrução perfeita para a vida.  

O Registro Inerrante da Palavra de Deus
A doutrina da “Inerrância Bíblica” decorre, naturalmente da sua “inspiração”. Assim como a doutrina da inspiração, os crentes devem considerar que os textos originais não possuíam qualquer erro de registro.
A doutrina da inspiração, tanto quanto da inerrância, tem a ver com o registro da Palavra de Deus e, por isso, devemos considerar inerrante é o livro “autógrafo inicial” que foi dado por meio o autor humano.
A preservação dos textos por meio de cópias que foram feitas ao longo dos tempos, está sujeita a erros ortográficos, contudo, a crença corrente no cristianismo histórico é que essa preservação também é resultado da obra de Deus que guarda a sua palavra para o seu povo.
Pois tudo quanto, outrora, foi escrito para o nosso ensino foi escrito, a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escrituras, tenhamos esperança (Romanos 15.4).
Mais uma vez os autores bíblicos, como Paulo aqui em Romanos, trataram o texto que tinham em suas mãos como inspirado e completamente confiável. Eles criam que as Escrituras não possuíam erros e a recebiam como Palavra de Deus.
Eles consideravam que as “promessas de Deus” propostas nas Escrituras eram absolutamente confiáveis e crer nelas era fundamental para dirigir a vida humana, de forma a agradar a Deus, porque era a revelação da “verdade de Deus”.
Digo, pois que Cristo foi constituído ministro da circuncisão, em prol da verdade de Deus, para confiar as promessas feitas aos nossos pais e para que os gentios glorifiquem a deus por causa da sua misericórdia, como está escrito: Por isso te glorificarei entre os gentios e cantarei louvores ao teu nome (Romanos 15.8-9).
Desta forma, como é possível perceber, os cristãos primitivos foram conduzidos a crer na revelação divina, como a “verdade de Deus” e a confiar nelas, porque as promessas de Deus são verdadeiras.

As Cópias dos Textos
Como enfatizamos acima, consideramos que os registros dos textos originais são considerados inspirados e inerrantes, mas a ação de Deus não parou na inspiração, devemos considerar que a “preservação da Palavra de Deus” também é uma obra de Deus. Contudo, devemos lembrar que em nenhum lugar da Escritura, temos uma defesa de que as cópias feitas eram inerrantes. A confiança nesta preservação pode ser vista em vários textos bíblicos. Mas se destaca na fala de Jesus:
Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da lei, até que tudo se cumpra (Mateus 5.18).
O curioso nessa fala de Jesus é o uso do termo “keraia” (pequeno chifre), que foi traduzido para o português como “til”. As letras hebraicas possuíam uma grafia bem desenhada e suas letras possuíam prolongações no desenho que ajudavam, algumas vezes, na pronúncia e cantilena do texto da Torah. Seja como for, Jesus está dizendo que o texto é preservado e a verdade que ele encerra junto.
Sem dúvida, os textos que temos em mãos, traduzido para o português, são traduções feitas baseadas em cópias do texto bíblico. Estes textos podem ser divididos em vários grupos, dependendo da época e localidade onde foram encontrados. Duas características são fortemente consideradas para se aferir as traduções: a) a antiguidade do texto; b) o número de textos concordantes.
Quando os estudiosos estão definindo qual a melhor tradução, antes eles devem definir qual seria o texto original. Então, eles usam os textos seguindo, em geral e resumidamente, estes dois critérios, procurando os textos mais antigos, mas também aqueles que estão em maior número.
Este procedimento é realizado, especialmente porque existem diferenças pequenas, mas importantes em cópias antigas e mais recentes. Claro que a questão da crítica textual não é resolvida de forma tão simples, mas é um bom princípio inicial para você entender o que tem em suas mãos.
As Traduções
As traduções são, portanto, o resultado desta compilação de textos e formação de um texto mais próximo possível do original. Você lerá em algumas traduções a seguinte informação: de acordo com os melhores e mais antigos manuscristos.
“Em muitas edições da Bíblia (principalmente Bíblias de Estudo), afirma-se que a tradução do texto do Novo Testamento segue os ‘melhores e mais antigos manuscritos’. Esta expressão só se tornou possível a partir da descoberta de muitos manuscritos antigos, nos últimos 200 anos. Entre esses manuscritos estão o Códice Sinaítico, o Códice Vaticano, o Códice Alexandrino, o Códice Ephraemi Rescriptus, bem como vários papiros. Um manuscrito mais antigo não é necessariamente melhor do que um manuscrito copiado em época mais recente, mas até prova em contrário um manuscrito mais antigo, que não resultou de um longo processo de sucessivas cópias, tem maiores chances de conter menos erros de cópia.
Por isso, as edições do Novo Testamento Grego chamadas de ‘críticas’ têm a preferência das Sociedades Bíblicas, em detrimento do assim chamado “texto recebido”, porque refletem o texto tal qual se encontra nos “melhores e mais antigos manuscritos”.
O ‘texto recebido’ foi elaborado por Erasmo de Roterdã, no século XVI, a partir de um punhado de manuscritos, copiados no final da Idade Média. No entanto, em termos de conteúdo, não há diferença substancial entre o ‘texto crítico’ e o “texto recebido”, pois, em geral, aquilo que o ‘texto recebido’ tem a mais reflete ou ecoa o que se encontra em outro lugar na Bíblia”.

Com certeza, o maior grau de diferença nas diversas traduções será encontrado no Novo Testamento, por causa da problemática da definição do melhor texto e mais próximo do original. Contudo, o problema das traduções não param somente na definição de qual o texto se aproxima do original, mas também esbarra na questão da adequação da tradução para os dias de hoje.
Você encontrará traduções com a intencionalidade de adaptação à linguagem mais moderna e algumas oferecendo certo teor interpretativo até. Ou seja, você pode ter adaptações do tipo:
O que não entre pela porta no aprisco das ovelha, mas sobe por outra parte é ladrão e salteador (João 10.1 – Versão Almeida Atualizada)

quem não entra no curral das ovelhas pela porta, mas pula o muro é um ladrão e bandido (Versão: Linguagem de Hoje).

aquele que não entra no aprisco das ovelhas pela porta, mas sobe por outro lugar, é ladrão e assaltante (Versão: NVI).

Mas também pode ter adaptações e ensinos verdadeiramente interpretativos como, por exemplo em Eclesiastes 11.1:
Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás (ARA).

Empregue o seu dinheiro em bons negócios e com o tempo você terá o seu lucro (BLH).

Atire o seu pão sobre as águas, e depois de muitos dias você tornará a encontrá-lo (NVI).
Uma opção mais segura para o crente que não possui treinamento teológico ou exegético, que nada conhece de grego ou hebraico, é ter algumas traduções à sua disposição e procurar compará-las. Por meio de estudos deve escolher uma tradução, carro chefe de sua devoção e manter suas leituras comparativas com as demais.
Em geral, eu prefiro a ARA – Almeida Revista e Atualizada, mas tenho bons colegas que estão dando preferência ao uso da NVI – Nova Versão Internacional, em virtude de sua linguagem mais adaptada.
Contudo, apesar das diferenças das cópias e as diversas traduções, vale a pena considerar que ainda assim, um processo divino está inserido nesta preservação e expansão da Palavra de Deus.
Quanto a mim, esta é a minha aliança com eles, diz o SENHOR: o meu Espírito, que está sobre ti, e as minhas palavras, que pus na tua boca, não se apartarão dela, nem da de teus filhos, nem da dos filhos de teus filhos, não se apartarão desde agora e para todo o sempre, diz o SENHOR (ARA – Isaías 59.21). 
“Quanto a mim, esta é a minha aliança com eles”, diz o Senhor. “O meu Espírito que está em você e as minhas palavras que pus em sua boca não se afastarão dela, nem da boca dos seus filhos e dos descendentes deles, desde agora e para sempre”, diz o Senhor (NVI – Isaías 59.21).

A Infalibilidade das Promessas de Deus
Decorrente também da inspiração, a doutrina da infalibilidade tem um conteúdo mais voltado para o mérito da Palavra de Deus, isto é, o fato de que as orientações nela contidas são o caminho da verdade e obedecer a Palavra é trilhar a vereda correta para a vida.
Porque para Deus não haverá impossíveis em todas as suas promessas (Lucas 1.37).
Pedro, diante de Jesus afirma que “somente Jesus tinha palavras de vida eterna”. Este era o espírito com que a Igreja neotestamentária encarou a palavra de Deus e se manteve firme no conceito de que a Palavra de Deus nunca falha.
A infalibilidade das Escrituras é aquela virtude da Palavra de Deus de ser a verdade, portanto, suas promessas não deixam de se cumprir e o que ela indica como estrada para a vida é o único caminho a seguir. A infalibilidade não se limita somente aos dizeres positivos, mas também aquilo que ela prognostica como ruim.
Passará o céu e a terra, porém as minhas palavras não passarão (Marcos 13.31).
A crença na infalibilidade das Escrituras é a principal alavanca para o temor cristão. Ou seja, o crente confia em Deus e treme do que sua palavra diz, porque sabe que não poderá fugir aos seus preceitos e se segui-los será bem aventurado.
Porque a minha mão fez todas estas coisas, e todas vieram a existir, diz o SENHOR, mas o homem para quem olharei é este: o aflito e abatido de espírito e que treme da minha palavra  (Isaías 66.2). 
Tudo o que as Escritura fala sobre Deus, sobre suas obras, seus intentos, sua vontade para a vida humana etc, tudo isto deve ser recebido com fé e temor, de tal forma que moldemos nossa vida segundo a Palavra.

Conclusão
A Bíblia, portanto, é a Palavra de Deus Inerrante e Infalível em virtude de ser soprada pelo próprio Deus que não pode mentir. Crer na Bíblia e viver segundo o padrão do seu ensino é um grande passo de sabedoria. Falhar em ouvir a voz de Deus e seguir sua orientação é, por sua vez, um passo equivocado.



domingo, 5 de março de 2017

Aula 3 - Prolegomenos - A Doutrina da Inspiração Bíblica e o Testemunho Interno do Espírito

AULA 03
A Doutrina da Inspiração Bíblica
O Testemunho Interno da Escritura


Introdução
Na aula passada, investigamos os valores e as implicações da sobrenaturalidade da Revelação Especial. O ponto que destacamos deste aprendizado é a unidade que há entre os aspectos naturais e sobrenaturais da realidade. Ou seja, devemos considerar que vivemos e nos movemos no meio natural, revestido pela presença e agir sobrenatural de Deus entre nós.
Esta unidade entre naturalidade e sobrenaturalidade é principalmente exemplificada na pessoa de Jesus, o ponto alto da revelação de Deus. Nele, no Homem-Deus, natural e sobrenatural se unem para abrir a porta do entendimento de toda a realidade centrada em Deus, na pessoa de Jesus.
O efeito mais importante da sobrenaturalidade da Revelação Especial de Deus é que ela, embora seja um produto do agir humano, isto é, foi escrita por homens, sua origem é divina, por meio do ato inspirador.
Nesta aula, nosso propósito é apresentar o mecanismo da Inspiração das Escrituras, o testemunho interno das Escrituras sobre sua Inspiração e a avaliar a importância disto para a construção de nossa fé e relacionamento com Deus.

O Sopro de Deus Para a Revelação
O apóstolo Paulo usou uma palavra composta para se referir à inspiração das Escrituras e indicar sua origem divina. O texto de 2Timóteo 3.16, tem uma peculiaridade, o que a Teologia chama tecnicamente de “Hapax Legomena” (uma palavra utilizada somente uma vez no texto bíblico).

Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça (2Timóteo 3.16).

A “hápax legomena” deste verso é a palavra grega “Theopneutos” (inspirada por Deus). Essa expressão indica a origem divina da Escritura, sendo ela um resultado o respirar de Deus, ou expirar de Deus para o homem.
O que Paulo deseja que Timóteo compreenda é que a vida cristã é um resultado direto da vontade de Deus apontando para o homem o caminho por meio de sua Palavra. Timóteo deveria confiar nas instruções, exortações, correções e todos os conselhos da Palavra nascida de Deus.

Toda a Escritura é Inspirada
O outro ponto que devemos destacar na percepção de Paulo é que ele compreendia que todo o texto, ou o “graphê” (registro) é resultado deste respirar de Deus ao homem. Paulo desejou que Timóteo confiasse em todo o registro da Escritura e depositasse nele sua esperança de viver para agradar a Deus.
Neste ponto, o que a doutrina da inspiração aponta é que o texto bíblico é totalmente uma obra de origem divina, trazida à realidade natural por meio da instrumentalidade dos homens que ele escolheu para esta tarefa. Pedro corrobora essa visão em sua instrução à sofrida igreja de seus dias.
Sabendo primeiramente, isto: que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação, porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo (2Pedro 1.20-21).
Quando tomavam o texto bíblico em suas mãos (Antigo Testamento), os apóstolos sabiam que estavam lidando com um registro inspirado. No entanto, sabiam que também estavam vivendo um momento especial da Revelação, porque, intuíram que também eles estavam sendo usados para falar da parte de Deus. Veja como Pedro equipara as cartas de Paulo aos Escritos dos profetas, ou “demais Escrituras”.
E tende por salvação a longanimidade de nosso Senhor, como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada, ao falar acerca destes assuntos, como, de fato, costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles (2Pedro 3.15-16). 
Por isso é que consideravam que a Igreja estava estabelecida a partir de dois pilares: o fundamento dos profetas e dos apóstolos. Neste sentido, sabiam que estavam sendo usados para anunciar a Palavra de Deus, uma vez que agora, falavam aos homens o que Jesus lhes ensinara.
Amados, esta é, agora, a segunda epístola que vos escrevo; em ambas, procuro despertar por lembranças a vossa mente esclarecida, para que vos recordeis das palavras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador, ensinado pelos vossos apóstolos (2Pedro 3.1-2). 
Por isso, tanto o Antigo quanto o Novo Testamento são aquilo que Paulo chamou de “Toda a Escritura” e deve ser recebido como o texto inspirado, soprado por Deus para seu povo.

As Evidências Externas da Inspiração
As evidências externas da Inspiração são aqueles elementos que constroem a credibilidade das Escrituras. Em geral, se recorre aos achados arqueológicos para comprovar a antiguidade das Escrituras, mas as evidências da inspiração bíblica são aqueles fatos que, uma vez, anunciados nas Escrituras, vieram a se tornar realidade.
As profecias, por exemplo, muitas delas, anunciaram a chegada de Cristo Jesus, muito antes dele nascer e os fatos publicados pela Palavra de Deus não falharam, assim as Escrituras recebiam a credibilidade como Palavra Inspirada por Deus, por jamais falharem.
Nenhuma promessa falhou de todas as boas palavras que o SENHOR falara à casa de Israel; tudo se cumpriu (Josué 21.45). 
A evidência do cumprimento da Palavra de Deus anunciada é a grande evidência externa do texto bíblico. Mas, devemos considerar também o valor que há na grande coesão da história contada nas Escrituras.
Quando notamos que a Bíblia se encaixa em um enredo de Criação-Queda-Redenção e que seus textos se unem formando um todo harmônico apesar de ter sido escrito por autores diferentes, em diferentes condições e épocas, só é possível considerar que há uma mente por detrás deste processo, conduzindo todas as coisas.

O Testemunho Interno do Espírito Santo
O Espírito Santo é o responsável pela ação inspirativa do texto bíblico original. Mas também é o responsável por fazer com que o crente e somente o crente, tenha o discernimento da verdade da Palavra de Deus. A este discernimento especial da parte do Espírito Santo, denominamos “Testemunho Interno do Espírito Santo”.
O próprio espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus (Romanos 8.16).
Este agir interno do Espírito Santo nos faz perceber e apreender o texto bíblico com a convicção de estar diante da verdade. Os apóstolos compreendiam que o Espírito é quem nos convence da verdade.
Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo (João 16.8).
Quando vier, porém, o Espírito da Verdade, ele vos guiará a toda a verdade, porque não falará por si mesmo, mas dirá tudo o que tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir (João 16.13).
Para muitas pessoas, a veracidade das Escrituras e sua inspiração seria melhor comprovada por fatos ou evidências externas, pois estas têm a característica mais empírica ou científica. Entretanto, o testemunho que realmente faz diferença na nossa relação com o texto inspirado é aquele que é produzido dentro do ambiente da sobrenaturalidade da Palavra de Deus, quando é aplicada ao nosso coração por meio da obra do Espírito Santo.


Conclusão

Terminamos esta aula com a noção da importância da Inspiração Bíblica para que nossa fé seja fortalecida em confiança e exclusividade de apoio no que a Escritura fala. Também consideramos que esta convicção se fortalece por meio da obra do Espírito Santo agindo em nós, quando nos guia a confiar no que estamos lendo, como sendo Palavra do próprio Deus.