domingo, 26 de novembro de 2017

Confessionalidade - Aula 8 - Do Livre Arbítrio

Aula 8
Do Livre Arbítrio


Introdução
A teologia de Westminster é fortemente ancorada em um entendimento da real condição espiritual do homem. Por isto, a construção do seu argumento era progressivo em mostrar como os homens estavam indispostos a andar na direção de Deus por causa do pecado, para depois mostrar a obra do Espírito Santo em transformar a vontade do homem, conduzindo-a de volta a vida de adoração e amor ao Criador.
O capítulo 9 da CFW carrega como tema primordial discutir a condição atual da vontade humana. Este tema é apresentado em um ponto sensível da CFW, pois é um ponto de partida para as obras redentivas que se seguem no coração humano, como veremos no desenho esquemático que apresentaremos no tópico inicial. 
Em nossa aula vamos verificar alguns aspectos deste capítulo. Primeiro, veremos como ele se encaixa dentro da estrutura do todo da CFW e qual a sua funcionalidade prática dentro do todo. Em seguida, vamos nos deter na estrutura interna do capítulo e como ele está internamente organizado. Num terceiro momento, vamos levantar os principais pontos da tratativa do livre arbítrio tratado no capítulo e por fim, vamos levantar algumas conclusões práticas sobre a importância deste conteúdo para a construção de uma mentalidade distintamente cristã. 

UM TEMA EXPLICATIVO – O COMPROMETIMENTO DA VONTADE HUMANA E O PROCESSO DE SALVAÇÃO
Neste primeiro tópico vermos como o capítulo IX da CFW se encaixa no todo e perceber a qual a necessidade de entender o comprometimento da vontade humana e a restauração da sua verdadeira lliberdade como ponto de partida para a ação do Espírito Santo no coração humano.
Dentro da construção do seu pensamento, os teólogos de Westminster parecem desejar instruir a igreja em um entendimento mais completo da obra de redentiva de Deus. Como já vimos fazendo anteriormente, queremos que os alunos notem que o argumento está sendo construído a partir fundamentalmente da Escritura. Eles sabiam que o argumento do sistema calvinista é um choque contra a teologia natural e, por isso, precisaram mostrar qual a verdadeira condição espiritual do homem caído.
Dentro da construção do seu pensamento eles propõe a doutrina calvinista da salvação como sendo um entendimento da REVELAÇÃO DE DEUS. Este entendimento da Revelação Escritural, aponta para o SER PERFEITO DE DEUS como o ponto de partida para toda a obra redencional, começando pela CRIAÇÃO DE TODAS AS COISAS E OS ATOS PROVIDENCIAIS de manter o mundo. A explicação da QUEDA e o PACTO DE GRAÇA de Deus como o homem são os assuntos que resumem a condição atual do homem, seguido pelo ponto de partida prático que é a OBRA DO MESSIAS, o MEDIADOR. Assim, a CFW chega ao capítulo 9, onde ela precisa explicar exatamente qual é o verdadeiro problema do homem em
relação a Deus: 



A INDISPOSIÇÃO DA VONTADE HUMANA. 
Este modelo esquemático mostra como a CFW está estruturada e de que forma o capítulo IX, que trata do Problema da Central da Vontade Humana, é apresentado como um ponto de partida para o entendimento da obra que Deus faz de restaurar o coração humano, redimindo pela obra do Espírito Santo.
O que notamos como pano de fundo do argumento de Westminster é a contrapartida à teologia arminiana e católica que desprezavam a extensão e a profundidade do comprometimento da vontade humana por causa do pecado. Neste sentido o capítulo IX é um capítulo explicativo, uma espécie de ponto de partida para tornar o argumento da obra do Espírito Santo mais fácil de se compreender. Em outras palavras, eles compreenderem que todos precisamos saber exatamente o que está acontecendo no coração humano, para que possamos desenvolver uma atitude positiva em relação à obra de Redenção que Deus desenvolve em nós, por meio do Sacrifício expiatório de Cristo e a aplicação destas virtudes no coração humano pelo Espírito Santo.

O CAPÍTULO IX E SUA ESTRUTURA INTERNA
O capítulo IX da CFW foi divido em 5 parágrafos e o tema central é A LIBERDADE DA VONTADE – O Livre Arbítrio da Vontade. Em todos os parágrafos, a palavra VONTADE é apresentada como sendo o ponto a ser explicado.
Toda a CFW está disposta para nos ensinar à respeito da resposta que devemos dar aos atos providenciais de Deus para nos salvar. O capítulo IX, entretanto, trabalha com o que realmente acontece em nós que nos impede de viver naturalmente para o Criador, isto é, O COMPROMETIMENTO DA VONTADE HUMANA.

A Vontade Humana foi Criada Livre
Neste capítulo, em sua primeira parte os teólogos trabalham com a ideia criacional da vontade humana, que é a de liberdade total para agir.
Deus dotou a vontade do homem de tal liberdade natural, que ela nem é forçada para o bem nem para o mal, nem a isso é determinada por qualquer necessidade absoluta de sua natureza (CFW IX-1).
Para os teólogos de Westminster, o homem foi criado com essa excepcional capacidade de agir livremente, segundo o seu querer, nem forçado ao bem, muito menos ao mal. Isto implica em um estado peculiar da natureza livre da vontade humana no momento em que este foi criado.
Num segundo momento, dentro deste primeiro aspecto criacional, os teólogos de Westminster organizam o texto para mostrar um detalhe desta condição criacional da vontade, que é o centro do que chamamos de livre arbítrio, a capacidade de agir de forma a mudar o seu estado de santidade original.
O homem em seu estado de inocência, tinha a liberdade e o poder de querer e fazer aquilo que é bom e agradável a Deus, mas mudavelmente, de sorte que pudesse cair dessa liberdade e poder (CFW IX – 2).
A primeira parte deste capítulo, portanto, aponta para a condição criacional da vontade humana e explica que o homem foi criado com uma liberdade total da vontade para agir sem ser forçado a nada, nem por sua natureza santa. Por outro lado, nesta primeira parte, eles explicam que o homem foi dotado criacionalmente com a capacidade de mudar sua condição de santidade e agir contrariamente à sua natureza, de forma que lhe foi dado a condição de cair dessa liberdade, escolhendo agir contrariamente à natureza com que foi criado para agradar o Criador.

A Queda produziu o cativeiro da vontade humana
O segundo ponto do capítulo IX é o central para a intenção dos teólogos na construção dos seus argumentos sobre a obra de Redenção e eles o explicam nos parágrafos 3 e 4, em dois momentos distintos.
O primeiro momento desta explicação é o de afirmação do poder do pecado em gerar um cativeiro para a vontade humana, levando o homem a viver compleamente comprometido com uma condição de aversão ao bem espiritual e à busca de Deus.
O homem, ao cair no estado de pecado, perdeu inteiramente todo o poder da vontade quanto a qualquer bem espiritual que acompanhe a salvação; de sorte que um homem natural, inteiramente avesso a esse bem e morto no pecado, é incapaz de, pelo seu próprio poder, converter-se ou mesmo preparar-se para isso (CFW IX – 3).
O tópico da profundidade e extensão do comprometimento da capacidade humana já havia sido tratado na CFW no capítulo VI, que trata da QUEDA DO HOMEM.
Por este pecado eles decaíram de sua retidão original e da comunhão com Deus, e assim se tornaram mortos em pecado e inteiramente corrompidos em todas as faculdades e partes do corpo e da alma (CFW VI-2).
Desta corrupção original, pela qual ficamos totalmente indispostos, incapazes e adversos a todo bem e inteiramente inclinados a todo mal, é que procedem todas as transgressões atuais (CFW VI-4).
Desta forma, os teólogos de Westminister deixam claro o que realmente acontece no homem, enquanto este não é atingido pela obra de redenção. A discussão teológica que está por detrás deste parágrafo 3, do capítulo 9, era contra a posição católica de que a vontade humana era boa ou a visão arminiana de que havia uma graça preveniente agindo na mente humana antes da conversão.
Por isso, o parágrafo 4, do capítulo 9, aponta assertivamente para o fato de que Deus é quem age para libertar o homem deste cativeiro da vontade, devolvendo-lhe à condição de capacidade de fazer de novo escolhas espiritualmente boas.
Quando Deus converte o pecador e o transfere para o estado de graça, ele o liberta de sua natural escravidão ao pecado e, somente por sua graça, o habilita a querer e a fazer com toda liberdade o que é espiritualmente bom, mas isso de tal modo que, por causa da corrupção ainda existente nele, o pecador não faz o bem perfeitamente, nem deseja somente o que é bom, mas também o que é mau (CFW IX – 4).
Neste segundo momento, a CFW propõe que a ação de libertação do homem acontece primordialmente no rompimento das cadeias de escravidão a que o pecado sujeitou o homem. Aqui a CFW enfatiza que este é um agir gracioso de Deus e que o que ele produz não é uma santidade obrigatória, mas uma capacitação ou habilitação da vontade de voltar a fazer a escolha livre pelo bem.
No final do parágrafo, os teólogos de Westminster apontam para o fato de que a presença do mal no coração humano, não é retirada totalmente e continua afetando a vontade humana, embora, no caso do regenerado, isso não seja mais uma condição de escravidão, mas sim de escolha pecaminosa. Isso, em parte, a CFW já havia ponderado quando descreveu o processo da queda.
Esta corrupção da natureza persiste, durante esta vida, naqueles que são regenerados, e embora seja ela perdoada e mortificada por Cristo, todavia tanto ela como os seus impulsos são real e propriamente pecado (CFW VI-5).

A Vontade Humana Será Liberta Totalmente da Escravidão na Glória
O tópico final do capitulo 9 é bem sucinto e aponta para a realidade da redenção final. Nele há uma palavra que revela uma visão gloriosa da redenção final que é a condição de imutabilidade que será conferida à natureza humana, depois da obra final do Espirito Santo no coração humano, isto é, a glorificação.
É no estado de glória que a vontade do homem se torna perfeita e imutavelmente livre para o bem só (CFW IX – 5).
Eles tentam contradizer alguns anabatistas e outros grupos que acreditavam em uma condição humana de impecabilidade neste humano, além de explicar em parte o que acontece com a igreja que ainda revela sinais de sua queda, apesar da obra regeneradora do Espírito Santo.  

QUAL A CONDIÇÃO REAL DA VONTADE HUMANA HOJE?
O ponto proposicional central deste capítulo é nos dizer que A VONTADE HUMANA ESTÁ COMPLETAMENTE COMPROMETIDA, isto é, que não existe mais livre arbítrio para a vontade humana, senão que o pecado é quem determina as nossas escolhas atuais e faz o homem ser avesso a todo bem espiritual, isto é, compreender a vida a partir e para o seu Criador.

A Vontade Humana Está Totalmente Cativa do Pecado e Não Há Livre Arbítrio da Vontade
Eles procuram nos fazer entender que Deus não criou o homem desta forma e não o submeteu a esta condição, que foi o homem que se enfiou neste caminho de astúcias pecaminosas, como Salomão havia dito:
Eis o que tão somente achei: que Deus fez o hoem reto, mas ele se meteu em muitas astúcias (Ec 7.29).
Desta forma, eles enfatizaram a condição bíblica de explicação sobre a natureza caída comprometida em obedecer ao pecado como um senhorio maligno ditando as inclinações da vontade humana.
Porque bem sabemos que a lei é espiritual, eu , todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado (Rm 7.14).
Para a CFW, precisamos reconhecer nossa completa incapacidade de qualquer bem espiritual (Rm 3.9ss) e nossa condição de miséria e condenação inevitáveis, para que nos preparemos para uma obra de redenção baseada completamente na graça de Deus e não em nunca em nós mesmos.

A Graça de Deus é o ponto central da nossa possibilidade de salvação
A CFW reforça a visão calvinista da salvação como obra inteiramente da graça, ao mostrar que somente Deus e pela sua graça é quem pode intervir na condição do homem e mudar as inclinações da sua vontade, habilitando-a novamente a querer o bem espiritual, isto é, agir de conformidade e na direção do Criador.
Ele vos deu vida, estando vós mortos nos vossos delitos e pecados (...) e estando nós mortos em nossos delitos, nos deu vida juntamente com Cristo (...) pela graça sois salvos (Ef 2.1-5)
Por isso, o que a CFW faz é propor uma visão pessimista do homem caído e otimista para o homem redimido. O pessimismo nasce de uma percepção completa do que o pecado fez na natureza humana e o otimismo vem da revelação do plano de salvação, do pacto de graça, por meio do qual, através do sacrifício de Cristo e da obra do Espírito, Deus salva o homem.

A Salvação é uma obra de Deus por meio do Espírito – preparando para explicar a obra do Espírito Santo.  
A CFW neste capítulo 9, abre alas para uma explicação completa da obra do Espírito Santo que se seguirá nos capítulos que seguem.
Porque o pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida e paz. Por isso, o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne, não podem agradar a Deus. Vós, porem, não estais na carne, mas no Espírito (...) SE porém, Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito é vida por causa da justiça. Se habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificara também o vosso corpo mortal, por meio do seu Espírito que habita em vós (Rm 8.6-11).
Esta explicação apontará para o modo como Deus vencerá a indisposição da nossa vontade mudando o coração humano, por meio da obra do Espírito Santo.

Conclusão
As conclusões a que chegamos neste capítulo são simples e necessárias. Primeiro, precisamos compreender que a vontade humana está comprometida em fazer a vontade do pecado e não a Deus. Portanto, o homem resiste a fazer a vontade de Deus e se inclina para o afastamento do Criador.
Compreendendo esta dificuldade humana na sua relação com Deus, o homem precisa de Deus para que este o restaure a vontade e a habilite a crer e a querer viver para a sua glória. Desta forma, precisamos de uma atitude de humildade na busca da presença de Deus e da mortificação a nossa carne para que o Espírito manifeste o seu poder em nós.

Porei dentro de vós o meu Espírito, e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis (Ez 36.27).

domingo, 5 de novembro de 2017

Confessionalidade - Aula 5 - Os Decretos Eternos de Deus

Aula 05
Os Decretos de Deus


Introdução
Como já vimos anteriormente, a Confissão de Fé de Westminster tem como fundamento para a sua teologia a Escritura e dela decorre todo o seu argumento. Também já tratamos aqui no fato de que a percepção da “soberania absoluta de Deus” é um assunto transversal que dirige a CFW. Tendo estes dois pontos primordiais em mente o tempo todo, vamos ao capítulo 3 e avaliar a teologia da CFW para compreender o modo como a realidade da vida humana vem à existência, a partir da vontade livre e soberana de Deus.
Lembrando que o propósito da CFW é nortear o relacionamento do homem com o Criador, do servo como o Senhor, a Teologia dos Decretos Eternos de Deus é basilar para isto. Por que é a percepção do valor dos decretos eternos de Deus que o homem aprende a perceber sua realidade criatural e a se entregar com confiança e esperança à vontade do Senhor.


A RELAÇÃO DOS DECRETOS DE DEUS COM A REVELAÇÃO
Um dos pontos mais importantes do Capítulo III é notar como ele é uma decorrência necessária e lógica dos capítulos I e II. OU seja, a afirmação bíblica é o ponto de partida para o entendimento da Teologia dos Decretos de Deus e o próprio ser de Deus é o seu fundamento.
Quando os teólogos de Westminster afirmam que todas as coisas que vêem à existência são fruto da livre e soberana vontade de Deus, que ordena a existência de tudo, eles o fazem baseados na Escritura. Uma teologia natural, nascida apenas da percepção humana e não da Revelação Divina, talvez nos conduziria à ideias relativas sobre Deus, nos termos em que ele não poderia ser soberano e livre. Mas a teologia de Westminster se fez cativa da Revelação e da interpretação das Escrituras sem imposição da lógica humana sobre ela.
Eles também fizeram uma relação direta deste tópico com o segundo capitulo, onde claramente se aponta para o ser de Deus como sendo “totalmente livre”. OU seja, a Teologia de Westminster é forjada a partir de uma percepção gloriosa de Deus como o Senhor absoluto de tudo e não determinado por nada senão por sua própria natureza santa.
Ele é um espírito puríssimo, invisível, sem corpo, membros ou paixões, é imutável, imenso, eterno, incompreensível, onipotente, onisciente, santíssimo, completamente livre e absoluto, fazendo tudo par a sua glória e segundo o conselho da sua boa vontade, que é reta e imutável (CFW II-1b).
A Revelação bíblica somada à percepção das gloriosas virtudes do ser de Deus são os elementos que conduziram os teólogos de Westminster a escrever este capítulo dos Decretos Eternos de Deus. A liberdade absoluta de Deus é uma das características mais destacadas do seu ser para a CFW e este valor perpassa o capítulo III em sua inteireza.
Deus tem em si mesmo e de si mesmo, toda a vida, glória, bondade e bem-aventurança. Ele é todo suficiente em si e para si, pois não precisa das criaturas que trouxe à existência, não deriva delas glória alguma, mas somente manifesta sua glória nelas, por elas e sobre elas. Ele é a única origem de todo ser; dele, por ele e para ele são todas as coisas e sobre elas tem ele soberano domínio para fazer com elas, para elas e sobre elas tudo quando quiser (CFW II,2a).
Então, quando lemos o capítulo III, precisamos fazer essa correlação entre a verdade apresentada como “Revelação” e a “natureza livre e soberana” de Deus. Estes são fundamentos da percepção de como Deus trás à existência tudo quanto existe e define absolutamente tudo como deve ser.

A LIBERDADE ABSOLUTA DE DEUS E A LIBERDADE DERIVADA DO HOMEM
O tópico central discutido neste capítulo é o decreto eterno de Deus de se relacionar com seu povo por meio do ato providencial da salvação. Em todo o capítulo este é o foco, como é o foco de toda a CFW estabelecer um bom relacionamento entre o povo de Deus e o seu Senhor.
Mas, antes de começar a definir este tópico, os teólogos de Westminster pontuaram sobre o fato de que Deus é o livre organizador de toda a realidade. Ele é soberano Senhor de tudo e de todos, contudo logo de início reconhecem e fazem uma observação importante, derivada da Revelação bíblica, ou seja, ele propõe no dilema “soberania de Deus” e “liberdade humana” um ponto escriturístico de limite teológico, cujo entendimento só pode ser alcançado por meio da humilde submissão à Revelação divina.
Desde toda a eternidade e pelo mui sábio e santo conselho de sua própria vontade, deus ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou a contingência das causas secundárias, antes estabelecidas (CFW III, 1).
Deus é livre para trazer à existência toda a realidade, inclusive a realidade moral. Esta última é a realidade de dar ao homem uma condição de fazer escolhas livres que correspondam ao seu caráter. Duas observações são postas nesta proposição da liberdade de Deus de trazer todas as coisas à existência, a primeira é a realidade do mal e do pecado, que precisa ser compreendido como fruto da moralidade humana que se desvia de Deus e da própria capacidade humana de agir moralmente.
Os valores que norteiam o coração do homem são as contingências das causas secundárias, ou seja, o coração do homem se inclina segundo a sua natureza, mas isso não surpreende a Deus que conhece o desejo do coração do homem e não o aliena disto.
A liberdade de Deus é tão absoluta que nem a realidade o controla. Este é um ponto que vemos trabalhado no item 2 do capítulo III. Neste tópico, os teólogos de Westminster estavam respondendo à indagações teológicas que se levantavam nos principalmente nos círculos arminianos. A Escritura claramente revela que Deus sabe todas as coisas que estão para acontecer, mas para os teólogos de Westminster, o pensamento arminiano que se baseia em parte da ideia de que a presciência de Deus sobre todos os acontecimentos é que controla as suas ações, é uma forma equivocada de pensar sobre Deus.
Ainda que Deus sabe tudo quanto pode ou há de acontecer em todas a circunstância imagináveis, ele não decreta coisa alguma por havê-la previsto como futura, ou como coisa que havia de acontecer em tais e tais condições (CFW III, 2).
Note que o ponto é que o fato de haver um futuro e Deus saber como ele será, não importa em que ele se submeta à realidade. Ao contrário, a realidade é fruto da vontade de Deus e não a vontade de Deus fruto da realidade. Este é um típico tópico em que os teólogos de Westminster fazem combinar uma absoluta submissão à Revelação com uma gloriosa percepção do ser livre de Deus, que se aprende na revelação.

A SALVAÇÃO COMO O FOCO DE DEUS NA SUA RELAÇÃO COM OS HOMENS CRIADOS
Os itens 3 a 8 do capítulo III da CFW apontam para a realidade eterna determinada por Deus para os homens que ele criou. Eles irão enfatizar o propósito eterno de salvar homens que moralmente se tornaram réprobos. Os teólogos de Westminster sabiam que estavam andando em águas turbulentas, então fizeram uma observação importante no tópico 8:
A doutrina deste alto mistério de predestinação deve ser tratada com especial prudência e cuidado, a fim de que os homens, atendendo à vontade revelada em sua Palavra e prestando obediência a ela, possam, pela evidência de sua vocação eficaz, certificar-se de sua eterna eleição (CFW, III, 8a).
Um dos aspectos que deve nos chamar a atenção é que a ideia dos teólogos de Westminster é promover uma percepção gloriosa do valor da eleição divina para o crente. O foco é a relação que Deus deseja estabelecer com seus eleitos e um apreço grandioso pelos atos providencias de Deus em favor da salvação que ele eternamente determinou.  

Eleição para vida e preordenados para a morte – o tópico 3 estabelece estes dois polos como fatores determinados, homens (e anjos) serão salvos; mas também homens (e anjos) serão condenados. O destino eterno dos homens (e anjos) está nas mãos de Deus, mas como vimos anteriormente, eles são moralmente responsáveis, tanto para uma coisa, quando para outra. Em ambos casos, Deus trás à realidade estas coisas para a manifestação da sua glória.
Que diremos, pois, se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição, a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão (Rm 9.22-23). 
A imutabilidade destes decretos é um fator de importante consideração na teologia de Westminster, isto é, não se trata de uma realidade imprevisível, mas de uma realidade que responde à vontade e ao plano eterno de Deus. A glória de Deus não é uma possibilidade, mas uma realidade que ele trará à existência. Ele é glorificado na salvação e na condenação. Na salvação por causa do seu poder sobre a morte e na condenação na demonstração clara de sua santidade e pureza absolutas.

Eleição e salvação como fruto da liberdade absoluta de Deus – Respondendo à teologia arminiana, os teólogos de Westminster, mais uma vez, fazem uma observação que aponta para a ideia de que Deus não é controlado pela realidade, mas o contrário, a realidade é controlada por Deus.
Segundo o seu eterno e imutável propósito, e segundo o seu santo conselho e beneplácito da sua vontade, antes que fosse o mundo criado, deus escolheu em Cristo, para a glória eterna, os homens que são predestinados para a vida, para o louvor da sua gloriosa graça, ele os escolheu de sua mera e livre graça e amor, e não por previsão de fé, ou de boas obras e perseverança nelas, ou de qualquer outra coisa na criatura que a isso o movesse, como condição ou causa (CFW III, 5).

Os fins e os meios para a salvação – a teologia da CFW aponta para a ideia de um Deus que controla a história e não somente um Deus passivo diante dos acontecimentos. A grande obra da história é a salvação dos filhos de Deus e para isto, fica claro na teologia da CFW que Deus dirige os meios conducentes para que sua vontade se realize.
Assim como Deus destinou os eleitos para a glória assim também, pelo eterno e mui livre propósito de sua vontade, preordenou todos os meios conducentes a esse fim (CFW III,6a).
Estes meios são resumidos em obras de salvação que serão tratadas posteriormente: eleição, remissão em Cristo, chamado eficaz e justificação, adoção, santificação. Deus ordena todas coisas para que seus filhos remidos sejam conduzidos à plenitude do relacionamento com Ele.  

Concede e recusa misericórdia pela sua livre vontade – ó tópico VII é uma consideração principalmente sobre a recusa da misericórdia de Deus. Neste tópico se ressalta a ideia de que tudo é para glória de seu soberano poder sobre suas criaturas. A salvação dos homens é resultado da sua vontade, mas a condenação é resultado do pecado humano. OU seja, Deus salva por que deseja salvar e condena porque o homem merece a condenação.   

Conclusão
O resultado pretendido pelos teólogos de Westminster é o que o crente confie no amor eterno de Deus e busque, por meio de um relacionamento de fé experimentar e certificar-se de sua eleição eterna. Esta percepção deveria causar admiração, amor, reverência a Deus, bem como atitude de humildade, obediência e conforto no coração dos eleitos.
Assim todos os que sinceramente obedecem ao Evangelho, esta doutrina fornece motivo de louvor, reverência, e admiração a Deus, bem como de humildade, diligencia e abundante consolação (CFW III, 8b).